Voltar à pág.
da coleção

Introdução
Capítulo I
Pecado Espiritual

Este livro foi registrado
na Biblioteca Nacional

Capítulo II
Paraíso dos Espíritos

CAPÍTULO III - FLORESTA ESPIRITUAL
Capítulo III
Floresta Espiritual

O jovem humano está cada vez mais confiante na arte de flutuar. Ele resolve voar agora em direção às formações rochosas próximas! Um ambiente todo escuro porque aqui são os corpos dos seres que emitem sua própria luz! Chegando onde queria percebe as diversas possibilidades que o aguardam! Primeiro flutua ao redor para reconhecer o local e depois entra voando nos enormes buracos e passagens na rocha! Sua luz pessoal ajuda-o a identificar o que há ao redor.

O rapaz para um pouco de voar pelo local e olha para trás onde observa que junto à enorme pedra plana as duas preguiças gigantes estão juntas flutuando pelo local. O ser de três patas e três olhos também flutua ali perto. As preguiças, devido à enorme calma de seus movimentos, flutuam naturalmente do mesmo modo..., ou seja..., lentamente. Enquanto os mais recentes moradores do local estão treinando a nova forma de transporte aéreo, surgem ao lado da pedra plana mais dois outros seres diferentes, vindos diretamente do interior da floresta iluminada! São seres totalmente diferentes daqueles que já ali estavam! Um deles é uma onça pintada e o outro um enorme albatroz! Agora começam novamente fortes raios de luz a incidirem sobre a enorme pedra plana, iluminando melhor toda região! Mais seres estão a caminho daqui!

O jovem rapaz retorna a seu treinamento e começa agora a ficar craque e já se arrisca a flutuar lentamente de olhos fechados por todo o local. Ele ainda bate a cabeça numa rocha, a mão em outra, raspa o joelho aqui, o pé ali, mas está melhorando cada vez mais! Poucas horas depois lá está ele flutuando tranquilamente em direção a tal floresta iluminada pelos milhares de seres que ali habitam. Quanto mais o jovem se aproxima, maiores são os detalhes que se vê do tal ambiente recheado de seres de todos os tipos que estão interessados em trocar informações e conhecimentos!

Ele percebe toda a beleza das árvores, pássaros voando e enormes animais que chegaram aqui vindos de diversos lugares do universo! O jovem e forte rapaz está cada vez mais entusiasmado para conhecer o lugar e seus seres! Ele aumenta a velocidade aérea e voa para lá. Ao chegar mais perto começa a flutuar mais lentamente para não tocar em nada. Observa cuidadosamente o local e nota que insetos e pequenos moluscos caminham calmamente pelo solo da floresta. O jovem gira em pleno ar para que sua cabeça fique próxima ao solo! Como tem cabelos curtos ele não corre o risco dos fios tocar em algo. Mentalmente ele cumprimenta a todos:


- Olá pessoal! Eu sou novo aqui!
(declara ele ao pequenino ser, enquanto percebe dois olhos muito azulados observando-o de longe).
- Olá! Eu também sou!
(informa o caramujo). O que está achando deste lugar?
- Não estou achando! Estou perdido! Acabei de chegar! Rsss!
- É eu também tenho muito que explorar! Você pelo menos pode voar! Eu só rastejo lentamente!
- Eu lhe daria uma carona, mas não posso tocar em você!
- Todo mundo faz esta piada comigo por aqui! Você não está sendo nada original!
- Para onde você está indo?
- Não sei! Qualquer lugar está bom! Não faz diferença a direção!
- Então..., por que está indo?
- Sei lá! Talvez para conhecer novos locais e outros para conversar!
- O que sabe sobre o mundo de onde veio?
- Como assim? Achei que eu estivesse sempre aqui!
- Não sei quanto a você, mas eu apareci sobre uma enorme pedra fora da floresta!
- Quando dei por mim já estava aqui neste lugar! Desconheço tudo o que falou!
- Interessante! Se todos nós somos iguais neste lugar, por que será que os seres pequeninos e as árvores têm tratamento diferenciado?

Ao lado uma frondosa árvore responde a ele:

- Somos todos seres muito mais evoluídos do que os outros! Alguns de nós estamos por aqui há tanto tempo que os mais antigos viram o início do universo carnal: O Big Bang!

O jovem, feito um Peter Pan voando, gira no ar novamente e se eleva para poder olhar mais de perto a tal árvore que com ele falou!

- Big Bang? O que é isso? (questiona o jovem humano).

Outra árvore, ali ao lado, responde às questões do rapaz. Ele vira-se para a direita para conversar com a planta que lhe responde!

- O universo nasceu numa explosão inicial gigantesca espalhando para todos os lados materiais e energia que geraram a vida que você vê aqui reunida! A esta explosão chamamos de Big Bang!
- Então as árvores têm tratamento especial por serem muito evoluídas e seres menores também! Então como ficam os seres como eu e os outros que em nada podem tocar aqui?
- O tratamento diferenciado é apenas para vocês! E não para nós e os pequenos seres que habitam a natureza de seus planetas natais!
- Entendi! Mas por que merecemos tratamento especial, então?
- Os seres mais recentes a serem criados, como a sua espécie, são tremendamente danosos ao ambiente! Por isso o Inferno carnal de cada origem está lotado de habitantes!
- Suas memórias anteriores não foram apagadas quando veio para cá?
- Não! As árvores têm suas histórias gravadas internamente nos troncos conforme crescemos e evoluímos. Por isso é fácil acessar tais informações!
- De onde você vem?
- Minha origem é a mesma da sua! Vivíamos todos em T!
- T? O que é T?
- Cada origem tem uma letra e um Inferno próprio e exclusivo. Você e eu somos de T! O caramujo com quem conversou é de A e assim por diante!
- Entendo! Mas como é a minha origem? É igual aqui?

- Nossa origem T é chamada de Terra-Paraíso! Uma estrela distante dentro do universo carnal. Nossas espécies são todas de origem inicial energética! Habitávamos em harmonia o interior daquele sol no início, mas quando tudo começou a ficar instável, com explosões solares mais frequentes, nós as árvores fomos transformados em espíritos viventes e enviados em grandes quantidades para cá para sermos purificados e treinados para a próxima fase de nossa existência! Vocês humanos são o final da destruição da estrela e, portanto, os seres mais novos do universo.

- Interessante! E por que viemos parar exatamente aqui?
- Este é um lugar para se reaprender a respeitar uns aos outros. Seres como nós, plantas e como os caramujos, somos mais antigos e já aprendemos a viver em harmonia! Mas o ímpeto de destruição de sua espécie é muito forte! Seu Inferno hoje, já está com bilhões de seres viventes, similares a você, pagando por seus pecados!
- Então eu sou um espírito?
- Sim! Todos nós somos! Somos todos aqui resultados da explosão de uma estrela!
- Em nosso local de origem vivemos apenas como energia?

- Sim! Somos todos apenas partículas. Quando a estrela explode, ela cria a nós, espíritos energéticos, e também cria a matéria que gera luas, detritos e planetas onde a vida carnal passa a ser possível. A estes locais chamamos de Inferno, porque é a carne que necessita cometer pecados e não o espírito!

- Por que só a carne comete pecados?

- Para ser um vivente é preciso fazer parte da cadeia alimentar e das mudanças constantes que o universo carnal necessita para continuar existindo e também evoluindo! Quando tudo foi criado no início, dois universos passaram a existir no mesmo instante: o espiritual e o carnal! Todas as espécies vivas nasceram originalmente de alguma estrela, cometeram um pecado aqui e foram enviadas ao Inferno. Este lugar aqui é um tipo de treinamento de convivência! A função é saber se você poderá ir além do espírito ou pagar por seus pecados no Inferno carnal!

- Entendo! E para onde vamos se passarmos neste teste aqui?

- Ninguém sabe ao certo! Alguns dizem que voltamos para a origem para realimentar o sistema universal espiritual eternamente! Outros dizem que vamos a um plano espiritual ainda mais superior! E assim a nossa existência deixa definitivamente o universo espiritual, quando um novo Big Bang ocorrerá no futuro sem que morramos no processo!

- Tudo é muito confuso! Não sei bem o que pensar sobre isso!
- É porque o seu espírito ainda não atingiu a maturidade necessária para imaginar possibilidades maiores! E é por isso que seu Inferno está cheio de seres vivos com espíritos encarnados!
- Bem! Eu não pretendo ir para o Inferno. Desejo ir além e não aquém!

Enquanto diz isso o jovem começa a flutuar para baixo e de costas, olhando em direção à árvore com quem conversa. Mas ele ouve uma voz em sua mente mandando-o parar de flutuar:

- Pare!!!!

O jovem para imediatamente e se vira para trás, quando percebe que parou a poucos centímetros do impacto contra um tigre de três metros de comprimento, que caminhava tranquilamente pelo solo povoado de plantas e pequenos seres. Os dois se olham bem de frente, olho no olho, preocupados, principalmente o rapaz, que pede desculpas:

- Sinto muito! Me concentrei na conversa com as árvores e não o vi passando!
- É que eu sou muito pequeno, mesmo!
(responde o tigre, ironizando a falta de cuidado do humano). Não se desculpe comigo! Se me tocasse é você que pararia no Inferno, não eu!
- Sim, mas pelo que me disseram, ao te tocar eu teria eliminado centenas ou talvez milhares de seres iguais a você lá no Inferno também! Por isso estou pedindo desculpas!
- Tome mais cuidado por onde flutua! Dizem que seu Inferno já está bem cheio de unidades como você!
- Sim! Tomarei!
(declara o desastrado jovem, que afasta-se dali lentamente e com cuidado).

Enquanto flutua suavemente o rapaz observa que aqueles dois olhos azulados ainda o observam de longe! Mais abaixo o jovem nota uma animada conversa entre patos num pequeno lago próximo. Eles fazem gozações com as atitudes dos outros animais, árvores, humanos e outros seres do lugar!

- Você viu aquela preguiça nova e enorme que chegou hoje aqui?
- Vi! Ela é tão grande..., mas tão grande..., que começou a atrapalhar o trânsito aéreo na floresta! Tá todo mundo flutuando cada vez mais lentamente por aqui, porque não sobrou espaço para os outros se movimentarem entre as árvores!
- Quaquaquaquaqua!
(riem todos os patos do grupinho nadando no lago, emitindo os sons mentalmente, é claro!).

O jovem humano, que flutuava acima deles, também está rindo da piada e resolve se aproximar um pouco mais, descendo lentamente perto dos patos piadistas!

- E o novo humano? Vocês viram? Rapaz bem apessoado! Ajudou a salvar a segunda preguiça do universo e com isso, estragou de vez o trânsito de espíritos aqui na floresta! Ele deveria ser enviado ao Inferno por causa disso! Vai que ele salva mais algumas preguiças se continuar aqui! Ninguém mais irá flutuar depois disso!
- Quaquaquaquaqua!
(riem todos os patos).

O jovem desta vez não gosta muito da piada, mas mesmo assim entende que eles estão apenas se divertindo e resolve entrar no papo!

- O quá que há, pessoal? Quá é a novidade?
(questiona ele ao grupo, usando a "língua dos patos", que ele acaba de inventar).
- O que vocês acham de votarmos uma lei contra piada ruim!
(comenta um dos patinhos). Basta uma piada ruim e o sujeito já vai para o Inferno. Para ele voltar ao Paraíso terá que aprender a contar piadas boas!

Outro pato do grupinho jocoso gosta da brincadeira e completa a sugestão do colega:

- É! Mas em alguns casos é possível que o sujeito não consiga mais voltar aqui!
- Quaquaquaquaqua!
(riem todos os patos).
- Pessoal! Eu gostei de vocês! Têm um senso de humor muito bom! O pessoal daqui deve gostar de bater uns papos divertidos assim?
- Eles gostam tanto de nós que tentam bater no nosso papo e aí vão todos rapidinho para o Inferno!
- Quaquaquaquaqua!
(riem todos os patos).
- Já mandamos mais de cem espíritos para morar longe daqui!
- Quaquaquaquaqua!
(riem eles novamente).

O rapaz percebe que é uma brincadeira e que não pode ser verdadeira tal história! Ele aproveita a oportunidade para fazer uma nova piada em cima da deles, achando que dessa vez irão rir junto com ele:

- Então, neste caso, a espécie de vocês já deve estar quase extinta no Inferno!!!! Kakakakaka!

Os patos param de rir e olham para cima, na direção do humano que flutua sobre eles. Estão, as aves, todas de "bico sério", mostrando ao humano que não gostaram dessa observação!

- Olha humano! Por que você não vai conversar com alguém que entenda menos de piadas do que você?
(questiona um dos patos). Assim não corre o risco de levar umas bicadas aqui!
- Bem, neste caso seriam vocês que iriam para o Inferno! O risco que correm é de encontrarem lá aqueles que bateram em seus papos! Kakakakaka!
- Vamos embora daqui!
(declara um dos patos, enquanto sai do local nadando! Os outros o seguem). Vamos nadar num lugar menos chato! Só tem uma coisa pior do que ir ao Inferno!
- E o que é?
(questiona o rapaz). Piada ruim?
- Não! Gente chata! Quaquaquaquaqua!
- É! Eu também não gosto não, mas dá para aturar vocês! Kakakaka!
(brinca o jovem). Quando quiserem se divertir mais basta me procurar!

Agora ele continua flutuando com muito cuidado para próximo de um ser muito mal-encarado, que lhe chamou a atenção desde que chegou à floresta! Ele tem três metros de altura, dois chifres laterais, cara de urso, olhos de uma única cor como nas cobras e de um azul claríssimo! Mesmo de longe são vistos por todos no lugar! Suas sobrancelhas enormes se prolongam até a narina à frente! Elas são rebaixadas, o que lhe dá uma aparência maligna! Seus braços enormes têm dois metros cada um, assim como as pernas! O tal ser fica flutuando como se estivesse sentado sobre as patas traseiras, exatamente igual a um cão, meio isolado dos outros, porque aparentemente não gosta muito de conversar! Mas mesmo assim o jovem rapaz aproxima-se e procura "puxar papo" com ele:

- Olá, meu amigo! Eu estava fazendo piada com os patos e eles não gostaram muito disso!
- Eu ouvi! São poucos que conseguem espantá-los daqui sem ir parar no Inferno!
- Você está falando sério?
- Eu sou sério! Não percebeu?
- Sim! Foi por isso que me aproximei de você!
- Não entendi!
- Quero conhecer todos aqui e você parece ter mais informações do que os outros!
- Deduziu isto porque sou mais sério do que os outros?
- Não porque notei que ninguém fala com você, desde o momento que cheguei.
- Achei que estava se concentrando em não tocar em nada aqui enquanto flutua!
- Bem...! Sim...! Também...! Mas descobri hoje que sou muito observador... e pelo jeito tenho alguma sensibilidade para descobrir quem é diferente da maioria!
- Está tentando me bajular, humano?
- Não...! Estou falando apenas o que estou sentindo neste momento...!
- O que você quer, afinal comigo?
- Eu...? Nada...? Quer dizer... talvez eu queira alguma coisa...! Mas nada especificamente...!
- Você quer saber mais sobre o universo e seu funcionamento?
- É esse tipo de informação que você tem disponível? E como sabe que quero saber mais?
- Ouvi você conversando com aquele que o recepcionou quando chegou, o Guardião!
- Como isso é possível? Estávamos muito longe daqui da floresta! Como ouviu isso?
- Eu posso fazer coisas que você nem sequer imaginaria!

Depois de alguns segundos de silêncio o sujeito muito feio resolve falar!

- Tá legal! Vou te contar algumas coisas...! Mas só porque espantou aquelas aves chatas daqui...!
- Obrigado!
- O que quer saber, exatamente?
- Bem...! Quero saber mais sobre o que acontece de consequências quando tocamos em algo não vivo? Como, por exemplo, na água ou no solo? Quer dizer..., já sei que eu irei para o Inferno se fizer isso, mas o que acontece à água ou ao solo?
- Você está com dor na consciência antes cometer o pecado?
- Rsrsrs! Não! Claro que não! Apenas quero entender um pouco mais sobre isso!

- Bem...! Ninguém aqui sabe sobre isso...! Quando você toca no solo ou na água, as consequências são para o ambiente do Inferno de sua espécie! Se tocar no solo estará criando um terrível terremoto e na água você gerará um violento Tsunami em algum lugar do planeta-Inferno! Qualquer um dos dois causará perdas de milhares de vidas de sua espécie viva carnal!

- Tem certeza? Isso é terrível!
- Sim! Nunca faça isso! É melhor tocar num ser vivo do que tocar no solo ou na água!
- E se alguém fizer isso, como poderia este alguém retornar para o Paraíso?
- Essa informação você não terá de ninguém aqui! É o segredo mais bem guardado deste lugar. Ninguém te ensinará a pagar a sua punição!
- Eu não pretendo cometer nenhum pecado! Estou gostando daqui! Eu apenas quero saber mais!
- Mas irá cometer em breve se não se concentrar no que faz! Você, apesar de observador, me parece ser meio desastrado! Jamais será um espírito evoluído, se continuar assim!
- Entendo! Farei o possível para não cometer nenhum erro!
- Agora vá! Já te dei a informação que requisitou! Deixe-me em paz aqui! E obrigado mais uma vez por espantar os patos! Eu já estava cansado de ouvir aquelas vozes mentais chatas!

O rapaz se afasta dali e vê ao lado uma mulher humana, das poucas de sua espécie que se encontram no Paraíso e resolve então conversar com ela.

- Olá, minha amiga! Que bom saber que não sou o único de minha espécie aqui no Paraíso dos Espíritos!
(declara o rapaz recém-chegado).
- Olá! Eu já tinha te visto de longe flutuando por aqui, neste lugar maravilhoso em que estamos!
(declara ela). É extasiante poder compartilhar sem medo, dor ou perigo com todos os seres do universo espiritual!
- Os seres daqui se preocupam muito com a vida passada, futura e com o Inferno!
(informa o rapaz). Mas não vi ninguém daqui até agora falar com a mesma paixão, como você, sobre o momento presente em que compartilhamos todos!
- Sim! Percebi que todos os espíritos dos seres do universo agem mais ou menos de forma similar! Todos vivem felizes aqui depois que conseguem retornar do Inferno! Quando se conhece o lado ruim das coisas os espíritos aprendem a valorizar sempre aquilo que eles não têm!
- Já esteve no Inferno humano e conseguiu retornar para cá?
- Sim! Infelizmente tive o desprazer de ir e a felicidade de voltar!
- Puxa! Ainda não tinha conversado com ninguém que tivesse ido e voltado do Inferno! Como conseguiu isso?

- Não foi nada fácil! Meu pecado aqui foi ter derrubado uma pilha dupla de pedras num canto da floresta. Eu me distrai olhando para outro lado, enquanto flutuava feliz por aqui. Enfim! As pedras caíram ao solo! Enviada ao Inferno descobri que fui responsável pela queda de torres gêmeas. Morreram muitas pessoas naquele dia! Descobri que tinha que ajudar a construir casas para pobres e assim pagar a minha pena pelo meu pecado cometido aqui!

- Como chegou a esta conclusão?

- Eu não cheguei! Foi o acaso que me levou a fazer isso. Fiz muitas coisas enquanto estava lá e um dia me chamaram para ajudar, de forma solidária, diversas pessoas que não tinham onde morar, assim como eu! Quando terminamos de construir as casas, muitas pessoas tinham sido beneficiadas! A mesma quantidade de mortos na queda das torres. A última casa que ajudei a construir era para ser a minha! Eu a doei para uma mulher que conheci nas ruas e que não tinha condições de trabalhar de forma voluntária! Depois que fiz isso, fui trazida de volta para cá numa forte luz espiritual! Agora flutuo bem devagar por aqui, porque não quero retornar ao Inferno novamente! É terrível viver lá!

- Incrível! Então a solução para você foi construir um lar para quem não tinha nada em troca dos mortos com as quedas das torres?
- Sim! O segredo de ser um bom espírito é saber se doar em apoio aos outros menos favorecidos! Parece que ser assim é inconcebível no Inferno, porque foge por completo do conceito da vida que é lutar para sobreviver.
- Como é o Inferno humano? Como vivem os espíritos encarnados lá?

- Só posso lhe contar sobre o que vivi! Não tenho como saber como é a vida de outros. A minha foi terrível! Cheguei lá sem saber de nada! Totalmente nua e sem ter como me defender contra os homens daquele lugar. Nunca senti tanto medo e dor em minha vida! Assim que cheguei fui violentada e apanhei muito de um grupo de vagabundos!

- Nossa!

- Quando acordei, depois de alguns dias, estava em um lugar diferente! Lá várias pessoas cuidaram de mim ao invés de me deixarem morrer! Eles vestiam branco como eu e você aqui. No início achei que tinha voltado para cá, mas quando comecei a sentir dores novamente percebi que ainda estava naquele Inferno! O lugar prega muitas peças aos espíritos desavisados! Os homens e mulheres de branco me deram remédios, enfiaram agulhas em meu corpo todo para me curarem. Demorou um tempo, mas fiquei boa novamente. Ao menos a carne estava curada, mas não meu espírito. Passei a ter muito medo de continuar vivendo no Inferno.

- Que horror!

- Um dia tive que sair de lá e me ofereceram uma oportunidade de frequentar diariamente um local. Eu não sabia qual era a utilidade daquilo! Não entendia por que é que eu precisava ir todos os dias a um mesmo lugar para fazer sempre a mesma coisa! Um lugar muito quente, barulhento e eu tinha que usar coisas na minha cabeça, ao redor dos olhos, envolvendo meus pés e roupas muito fechadas que me incomodavam! Me diziam que eram para a minha proteção! No final me davam um montinho de papéis retangulares para que eu pudesse adquirir o que eu precisasse com aquilo! Mas eu tinha que continuar todos os dias indo ao mesmo lugar para depois de trinta dias receber novamente aqueles papéis, que segundo eles mudavam a vida das pessoas para melhor! Incentivada, resolvi então usar os tais papéis! Não consegui adquirir nenhuma das coisas de que eu precisava para viver melhor! Eu queria uma casa, um meio de transporte, equipamentos para acelerar a preparação de comidas, equipamentos de informação. Mas aqueles papéis de nada me serviam! Onde quer que eu fosse me diziam sempre a mesma coisa! Eu precisava ter muito mais do que aquilo para adquirir qualquer recurso que eu precisasse. Descobri que estavam me fazendo de escrava. Os responsáveis pelo lugar ganhavam muito mais do que me davam! Eles sim poderiam adquirir as coisas de que eu necessitava! Então parei de frequentar o tal lugar. Era algo inútil a se fazer! Aquilo não trazia nenhum benefício para mim ou para a minha missão de retornar ao Paraíso. Comecei a sentir muitas dores novamente e ter diversos problemas de saúde! Me informaram que eu estava com uma doença terminal, por conta do tal estupro que eu sofri logo que cheguei ao Inferno! Me disseram que eu iria morrer muito em breve! Mas isso não fazia diferença mais para mim, porque viver no Inferno é saber que a morte chegará em algum momento! Quando fui para lá já sabia que isso aconteceria um dia. Foi nessa época que comecei a ajudar as pessoas necessitadas também! Pelo menos senti que isso ajudava alguns espíritos tão desenganados quanto eu a viverem um pouco melhor e assim eu me mantinha em movimento, à procura da solução para a minha própria vida! Trocava minha ajuda diária às outras pessoas por comida e um lugar para dormir! Assim fui vivendo! Me chamaram para ajudar na construção das tais casas, que já lhe falei. Foi um trabalho muito duro que fiz com prazer! Minha recompensa foi poder voltar para cá depois disso!

- Incrível! Estou impressionado com toda essa história!!!!

- Faça o possível para não cometer nenhum pecado aqui! Sua pena pode ser muito difícil de ser paga! O Inferno está cheio de espíritos encarnados e desenganados, que não conseguiram retornar para cá e se perderam pela eternidade por lá! Não é nada fácil encontrar o caminho de volta! O sofrimento pode ser superior à disposição para voltar ao Paraíso. A maioria se perde naquele lugar terrível. Lá é muito fácil de ser ludibriado! As coisas que as pessoas fazem diariamente, apenas distraem a mente dos que já não têm mais um caminho a seguir! É muito triste a vida naquele lugar! Todos são e estão enganados sobre o que devem realmente fazer ali! Preocupam-se com coisas inúteis, o que piora a vida deles mesmos, dos outros humanos e seres vivos do lugar! E assim tudo simplesmente vai ficando cada vez pior, apesar de muitos dizerem o contrário! Dizem que a humanidade tem melhorado desde quando os primeiros humanos chegaram ao Inferno! Mas não é verdade! Olha... eu não quero mais falar sobre tudo isso! É muito triste a lembrança de ver toda aquela gente sofrendo!

O rapaz, ainda impressionado com a incrível história da mulher humana, agora percebe que algumas belas aves, muito diferentes, voando em formação por cima de um lago ali próximo! Seus corpos mudam de cor continuamente como faz um polvo no mar da Terra! Elas são grandes com mais de um metro e meio cada uma! Seu bater de asas não emite som algum! São batidas suaves e leves. O bico frontal de vinte centímetros é rotacionado em noventa graus em relação às aves da Terra e, portanto abre-se de lado como um alicate! O pequeno bando de dez aves parece bailar em sincronia e cores, fazendo círculos no ar como faria a esquadrilha da fumaça em seus aviões! O grupo alado de espíritos dá rasantes sobre a superfície do lago próximo! As aves encostam suavemente a ponta de uma de suas asas! Isto cria linhas e curvas sobre a superfície aquática! Cada uma faz um traço específico, gerando belas formas geométricas durante a sua passagem por ali! O jovem rapaz fica maravilhado com o que vê!

- Você viu aquilo?
(questiona ele à amiga humana que acabara de conhecer). É incrível! Vamos até lá?
- Não gosto de ficar perto de muitos espíritos ao mesmo tempo! Não quero tocar em nenhum deles! Não vale à pena o pecado! Vejo tudo, todo dia, daqui mesmo. E fico feliz com isso!
- Vou dar uma olhada mais de perto e daqui a pouco eu retorno aqui para continuarmos! Quero saber mais sobre a vida aqui no Paraíso!

O rapaz flutua rapidamente em direção ao espetáculo dos espíritos da família dos emplumados! Duas aves, em pleno voo, viram-se de barriga uma contra a outra em pleno ar, sem se encostarem, e batem as asas de forma sincronizada para que as de um não atinja as do outro durante a apresentação! O impetuoso jovem não resiste à tão belas manobras! Ele decide flutuar para acompanhar tais aves bem de perto, enquanto conversa com elas. Entrando em formação o humano começa a conversar:

- Olá! Vocês são incríveis! Como aprenderam a fazer isso?
- Olá! Tudo o que fazemos é instintivo! Não precisamos treinar!
- Fascinante! Posso acompanhar vocês, enquanto conversamos?
- Claro! É sempre bom termos companhia nos voos!
- Tem mais alguns espíritos como vocês por aqui?
- Não! Apenas nós! Achamos que houve algo errado de onde viemos: a nossa origem! Estamos aqui há milhares de anos e não recebemos mais ninguém de lá! Nenhuma outra espécie da origem!
- O que acha que aconteceu?
- Conversamos com todos aqui e o ser de olhos azuis acha que nossa origem desapareceu!
- Como ele poderia saber sobre isso?

- Ele não fala muito! Mas sabe mais do que demonstra ou comenta! O ser de olhos azuis acha que nossa origem foi engolida... por um buraco negro! Acabou! Nos informou que devemos evoluir para o próximo nível o mais rápido possível, porque talvez nosso Inferno tenha tido também o mesmo fim! E assim só nos resta a evolução ou a extinção completa de nossos espíritos!

- E como farão para evoluírem?
- O espírito de cada espécie tem que cumprir o seu papel evolutivo aqui para atingir o próximo nível! Não se vai para o outro lado porque se quer! Mas sim porque merece!
- Acho tudo isso muito complicado! Regras estranhas! Muitas dúvidas pairam sobre o futuro! Não gosto disso!
- Então! Chega de papo! Vamos só flutuar!
(declara a ave com quem o rapaz conversava).
- Sim! Está bem! Façam o que quiserem que eu sigo vocês!
(declara ele).

As aves agora começam a voar em linha em direção ao céu e depois em queda livre, fazendo grandes círculos sobre a copa das árvores e depois um rasante sobre o lago. O jovem humano acompanha-as como pode. Ele está se divertindo muito e feliz por poder compartilhar um momento tão especial com aqueles belos espíritos alados! Durante o rasante sobre o lago as aves novamente encostam bem suavemente a ponta de uma de suas asas na superfície, fazendo novos desenhos na água. O jovem sabe que não pode fazer isso e assim apenas acompanha-as de perto sem tocar na água. Ele observa o grupo dos patos nadando por ali e resolve fazer uma piada rápida com eles:

- Segurem suas penas espirituais! Estou passando! Rssssss!

Um dos patos reclama da piada:

- Não se pode nem nadar tranquilamente por aqui! Que Inferno!
- Quaquaquaqua!!!!
(os outros morrem de rir da piada infernal do colega).

Feliz e seguindo os novos colegas aéreos o jovem está sorrindo o tempo todo! De braços abertos e curtindo cada manobra, ele agora percebe uma mudança repentina no voo daqueles que vão à frente. As aves e ele voam em linha e enquanto as primeiras se desviam bruscamente para a esquerda, gritam mentalmente para ele:

- Cuidado!!!!! Cuidado!!!!

Todas se desviam quase ao mesmo tempo e o jovem também o faz rapidamente para não bater num outro ser que estava flutuando ali perto calmamente! Era um pequenino ser alado, um tipo de inseto estranho com quatro cabeças e oito asas. O rapaz quase abalroou o pequenino durante sua mudança acentuada de direção. Devido a isso a pontinha do dedo indicador de sua mão esquerda rasga a superfície do lago suavemente, criando uma nova linha destoando nos desenhos que as aves já haviam feito. Ao mesmo tempo um enorme volume de água no Mar da Indonésia, aqui na Terra, é deslocado, como se o próprio dedo de Deus empurrasse uma infernal onda marinha contra as ilhas e continentes de toda aquela região!

De volta ao Paraíso dos espíritos o jovem olha apavorado para o que fizera, recolhendo rapidamente sua mão e posicionando-a junto ao corpo! Ele parou imediatamente de flutuar e de seguir as aves, que se afastaram rapidamente dali. Todos os outros seres do lugar procuram fazer o mesmo agora, inclusive o pequeno e estranho inseto, que voa rápido para se distanciar dali! Ao longe o ser de olhos azuis balança negativamente a cabeça para o jovem desastrado, que olha agora ao redor e percebe que diversos seres pararam de conversar e o observam atentamente, aguardando o desfecho final!


Enquanto luzes começam a brilhar no céu como raios, anunciando algo terrível que irá acontecer em breve, a mulher, que tinha conseguido retornar ao Paraíso, olha desolada para ele! A bela ex-pecadora ameaça chorar, sabendo que o futuro será cruel para quem vai ao Inferno carnal, mas não há líquidos nos corpos dos espíritos que são puramente energia, portanto o choro dela não é precedido por lágrimas! Nenhuma comunicação acontece no Paraíso! Todos observam a presença do idoso homem que aparece flutuando, vindo do interior da floresta. Ele olha sério ao rapaz, decretando mentalmente:

- Eu disse que deveria treinar muito bem seus movimentos. Sua pressa em participar da vida espiritual na floresta o está levando de encontro ao seu destino! O ciclo começa para você! Descubra como pagar por lá seu pecado e poderá retornar novamente para cá! Estou muito decepcionado com você!

O jovem olha desconsolado para o idoso espírito! Ele está arrependido de tal ato! Os clarões se intensificam no céu e finalmente uma forte luz se concentra totalmente sobre o rapaz condenado! O pecador desaparece dali e está a caminho para longe do Paraíso dos espíritos, sem escalas até o Inferno carnal humano! Os patos espirituais continuam nadando tranquilamente no mesmo lago onde as aves faziam suas proezas. Um dos patos comenta o fato:

- Pelo menos não ouviremos mais piadas ruins!

Um segundo pato reprime o primeiro:

- Não teve graça sua observação! Ele era um dos poucos que entrou em nosso círculo de conversas, se arriscando a contar piadas! Tudo bem que não sabia fazer nenhuma boa, mas acho que sentirei falta dele!
- Eu sei que não teve graça! É um novo tipo de piada que estou criando!
- E que tipo é esse?
- Estou chamando de humor infernal! Mas tem razão! É triste quando algum espírito vai ao Inferno! Ele passará o diabo por lá!

Um pato olha para o outro e continuam nadando tristes pelo lago. Aquelas dez aves que voavam felizes sobre o lago fazem um novo desenho com a ponta de suas asas sobre as águas! Agora surge a imagem de um coração. Uma das aves faz um movimento de voo e cria um risco que atravessa o desenho que parece se partir em dois, representando que elas acabam de perder um amigo! A mulher, que retornou do Inferno, abaixa a cabeça, triste porque sabe o que ele poderá passar por lá! É um dia triste no Paraíso cada vez que alguém parte para o mundo inferior!
Capítulo IV
Encarnado no Inferno

VOLUME
1

Capítulo V
Gula

Capítulo VI
Inocência

Capítulo VII
A Bebida

Capítulo VIII
Amnésia

Capítulo XII
Mentira

Capítulo IX
A Missão

Capítulo XIII
Nova Casa

Capítulo X
Loucura

Capítulo XIV
O Dono do Inferno

Capítulo XI
Luxúria

Capítulo XV
Ira

Capítulo XVI
Egoísmo

CLIQUE AQUI
PARA COMENTAR
SOBRE ESTE LIVRO

Capítulo XVII
Arrogância

Capítulo XVIII
Preguiça

Capítulo XIX
Avareza

Capítulo XX
Inveja

Capítulo XXI
Ascensão

HOME