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O BARCO INVISÍVEL
GUERRA DE INVISIBILIDADE - Vol. III

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INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I
INIMIGO OCULTO

CAPÍTULO XXIV
A REPÓRTER É A NOTÍCIA

CAPÍTULO XXVII
LAR DAS ONÇAS

CAPÍTULO II
POSSE CIBERNÉTICA PÚBLICA

CAPÍTULO XXV
BALAS POR ARMAS

CAPÍTULO III
REUNIÃO DE GUERRA

CAPÍTULO XXVI
FAMÍLIA EM PÂNICO

Pedro está sentado numa pedra sozinho próximo à margem do rio que deságua no Rio Negro em Cucuí, no Amazonas. Seu braço já foi medicado. O tiro fora apenas de raspão! Não foi preciso cirurgia. Então ele ouve um som suave e conhecido. A porta do barco invisível se afunda na estrutura interna e corre lateralmente para o interior da embarcação. Os degraus se articulam para fora, tornando possível que o sargento possa entrar no barco invisível. Ele olha para a entrada sem sair do lugar.

Dali aparece Sabino acenando para o sargento, enquanto a porta do andar de cima também se abre e duas cordas são disparadas com força em direção ao solo. Os dois soldados-aranhas, que ficaram no local, invisíveis todo o tempo, se aproximam. O primeiro agarra uma delas e é puxado para cima enquanto caminha pela superfície inclinada do local, penetrando logo depois no interior da embarcação. O segundo aguarda o primeiro iniciar o movimento e logo depois repete o gesto com a segunda corda.

- Vamos lá, sargento! (grita lá de cima Sabino).

Pedro, desolado, se levanta lentamente dali e caminha devagar em direção ao barco invisível. Ele começa a subir as escadas e encara Sabino de frente ao chegar ao topo.

- Da próxima vez que eu mandar não interferir numa briga minha, respeite a minha ordem! Sou superior a você! (ordena o sargento Pedro ao cabo Sabino).

Sabino engole em seco enquanto sai da frente para a passagem do superior. Ele faz a continência. A porta desliza novamente para se fechar enquanto os degraus articulados retornam à posição de invisibilidade. Lá dentro Pedro para de andar porque se defronta com algo inesperado. O sargento vê a pequena indiazinha Poti saindo da cozinha com muito cuidado. A menina mantém as mãos à frente tateando o ar e os braços semiflexionados para evitar algum impacto com paredes e objetos do ambiente, já que não enxerga nada!

- Fernando! Acho que o filhote de onça fez sujeira de novo! Está cheirando muito mal aqui! (comenta Poti, falando alto com o jornalista).

Pedro olha assustado para ela, imaginando que talvez fosse ele mesmo a fonte de ar impuro que a menina comentou. O sargento ergue um dos braços para sentir seu próprio odor e percebe que é exatamente ele quem está cheirando mal!

- Que droga! Já não falei para você fazer sujeira em cima da madeira que eu deixei no banheiro? (indago eu, Fernando, acreditando vir do filhote o cheiro ruim, mas ao sair da cozinha encontro de frente o sargento e, assustado, paro de andar). Ahhh! Olá, senhor Pedro...! Humm...! Poti! Já sei de onde o odor está vindo...! Acho melhor o senhor tomar um banho urgente, sargento!

- Boa tarde para você também, jornalista! (declara Pedro que passa por mim e vai até a porta do local de banho. Ele a abre e do lado interno do local o sargento vira-se de frente para um armário fechado, disponível no corredor lateral).

Pedro coloca seu polegar direito sobre o painel ao lado do armário e este se abre para ele. Ali existem diversas roupas, todas dele.

- É! Parece que este armário terá um novo dono daqui para frente (declara o sargento).
- Quem é ele? (indaga Poti ouvindo a voz de Pedro). É mais um amigo invisível, Fernando?

Pedro olha para mim sem entender o que está acontecendo!

- A garota não está me vendo? (pergunta Pedro).
- Ela sofreu um trauma, sargento (declara Sabino que está ali perto). Perdeu toda a sua família e os outros membros da tribo onde morava.
- Foram as FARC? (indaga Pedro).
- Não sabemos, senhor! (responde Fernando). Talvez isso nunca fique claro! Vamos levá-la para a FUNAI em Manaus.

Agora aparece caminhando alegremente o filhote de onça. Ele para diante de mim! Ergue a cabeça me encarando com aquele olhar de: "estou com fome"!

- Já quer comer novamente, né? (indago eu ao filhote que continua me encarando). E você, Poti? O que quer comer agora?
- Nada não! (responde ela caminhando de braços esticados para a frente indo em direção ao quarto ali ao lado).
- Para alguém de cidade grande, você parece ter se adaptado bem aos personagens da selva! (comenta Pedro). Já está até criando animais e crianças!
- Ahhh! Estou pegando o jeito! E o senhor, sargento? Quer que eu lhe prepare alguma coisa?
- Me vê uma pizza, um churrasco ou uma feijoada! (declara Pedro).

Sabino sorri para a brincadeira de seu superior!

- Não temos nada destas coisas a bordo, senhor! (declaro eu, Fernando). Mas posso lhe oferecer uma barra de cereais!
- Já estou cansado de barra de cereais e frutos da floresta. Eu tinha esperanças que vocês tivessem trazido algo especial para mim! (comenta Pedro). Vou tomar um banho! Depois eu verei alguma coisa para comer.

O sargento brasileiro fecha a porta do local reservado par o banho, enquanto olho para Sabino, estranhando o jeito de Pedro.

- Ele está bem? Me pareceu um pouco... triste pelo fim da missão...! (digo eu).
- O sargento sabe que esta foi sua última missão na floresta amazônica! (informa Sabino). Ele sabe que não infiltraremos mais ninguém entre traficantes e guerrilheiros. Com a situação fugindo ao controle aqui na região, este tipo de operação tornou-se impossível! Acho que ele preferiria continuar entre assassinos a retornar ao mundo civilizado!

O filhote agora começa a emitir alguns sons em protesto pela minha demora em lhe dar alimento.

- Ahhh! Tá legal! Já vai! Eu me distraí! (digo eu ao pequeno predador). Hoje ele me pede comida. Mas em poucos meses eu posso me transformar no prato principal dele. Portanto, é melhor eu tratar bem dele agora..., não é Bola-de-pelo? (indago eu ao filhote que lambe os beiços à espera de alimento).

Eu esquento o leite no micro-ondas, me agacho e coloco o pratinho no chão para ele beber. Enquanto observo de perto o pequenino animal beber avidamente seu líquido branco precioso, acaricio os pelos das costas do belo animal. Olho para Sabino e o indago:

- Já encontraram algum local para levar o Bola-de-pelo?
- O comandante fez alguns contatos com militares em Manaus que indicaram uma ONG de Goiás que cuida de onças!
- Goiás? Não é meio longe do lar que este filhote conhece? (indago eu).
- O Bola-de-pelo é muito jovem, Fernando! Ele se adaptará bem (responde Sabino). A responsável pela ONG irá nos encontrar em Manaus. O nome dela é Cristina!
- Acha que cuidarão bem dele por lá? (indago eu, preocupado com a vida de meu pequeno amiguinho).
- Aqueles que se dedicam de corpo e alma à conservação de animais e da natureza, são pessoas especialmente devotadas à causa. Tenho certeza de que ela o tratará como um filho da casa, com muito carinho e devoção às necessidades do Bola-de-pelo.

Eu olho de volta para meu amiguinho e continuo acariciando as suas costas. Lá fora o dia já está escurecendo. Muito em breve chegaremos em Manaus. A previsão é para amanhã de manhã. Depois de poucos minutos o sargento sai do banho usando apenas uma toalha na cintura e nada mais. Com as roupas nas mãos ele se encaminha para o quarto onde está Poti. Eu vejo aquela cena e vou até lá também:

- Sargento! Temos uma menina a bordo!!!! O senhor não pode sair do banheiro desta forma! (digo eu a ele).
- Achei que o cabo tinha dito que ela não está... enxergando...!
- Mesmo assim...! O caso dela é psicológico! E se ela voltar a enxergar exatamente neste momento...? Terá outro problema psicológico para tratar...!?!?
- Tem razão, jornalista...! Fiquei tanto tempo na selva que acho que perdi um pouco a consciência do significado de viver em sociedade!
- Tudo bem, sargento! O senhor é um herói nacional...! Mesmo que o restante do mundo não saiba disso..., eu sei! E isso constará em meu documentário!

Pedro olha para mim, descontente com o novo estilo de vida que ele terá que levar, e retorna ao local de banho para se vestir. Olho para a cama e Poti está ali, deitadinha na cama com seu vestido longo feito de um tecido rústico. Eu me agacho ao lado da cama e converso com ela.

- Já vai dormir, Poti?
- Sim! Não posso nada neste lugar estranho...!
- Sim...! Eu sei...!
- Aquela mulher pode vir até aqui para dormir comigo?

Eu olho para ela, triste porque percebo a falta que faz a presença de sua mãe e conhecidos.

- A voz feminina que você ouve... é minha amiga invisível...! Ela não pode tocar em ninguém... e nem dormir...!
- Ahhh...! Que pena...! Eu queria mesmo é a minha mãe aqui comigo...!
- Eu sei, Poti...! Sinto muito pelo que aconteceu...!

- Eu ouvi o tio Sabino conversando com o tio Everardo! Ele disse que a situação ruim da floresta é culpa de vocês!?!? Tio Sabino disse que os homens maus estão matando todo mundo...! É verdade...?

- Todos nós aqui estamos tentando eliminar os homens maus da vida da floresta. Eles dominam este lugar há muito tempo. Achamos que isso deve acabar. Nós estamos os expulsando daqui.
- Mas porque eles mataram todo mundo? Não fizemos nada contra eles!

- Eu não sei, Poti! Os homens brancos alegam que são evoluídos..., mas quanto mais precisam provar que o são..., e que lutam por algo bom para a maioria... muitos sucumbem ao antigo animal que fomos no passado e que pelo jeito... sempre seremos!

- Os animais não fazem o que homens brancos fazem! (diz ela sabiamente para meu total desconcerto).
- Tem razão, Poti...! Acho que comparar o ser humano aos animais... é um grande erro...! Eles só matam para sobreviver...! O que não é mais o nosso caso...!
- Por que o homem branco é assim?
- Nem todos o são! Eu, o tio Sabino, o tio Everardo e o tio Pedro não somos assim!
- Mas vocês matam os homens maus da floresta...!
- É...! Mas isso é diferente...! Estamos fazendo isso para que pessoas como você e animais como o Bola-de-pelo possam viver em paz...!
- Não entendo...! (declara a menina).
- É...! Na verdade...! Eu também não entendo...! (concordo eu).
- Ser da cidade é complicado...! Prefiro ser índia!
- Rsrsrs! Eu gostaria também de ser índio! Você me ensina como fazer isso?
- Quer ser índio?!?!
- Por que não? Não estou fazendo nada neste momento...!

- É fácil ser índio! Você tem que nascer na tribo para ser índio de verdade. Os meninos passam por rituais até crescerem e você não passou por nenhum! Então vai ser difícil se tornar alguém do mato...!

- Tá...! Eu entendo...! Mas o que é preciso fazer para viver na floresta como um índio?
- Você tem que respeitar tudo o que existe na floresta! Antes de matar um animal você deve agradecer ao grande Deus.
- Agradecer a Deus...! Tá... vou me lembrar disso...!
- Depois você deve matar o animal com armas da floresta...! Nunca deve usar armas de fogo...! Isso não é direito...!
- Nunca usar armas de fogo...! Tá vou me lembrar disso também...!
- Você deve usar veneno da floresta para matar! Só assim é que você se alimenta.
- Da floresta para a floresta...! Acho que consigo fazer isso também...!
- Você conhece veneno da floresta?
- Eu? Não! Não tenho a menor ideia de onde encontrar um veneno na floresta. Existem prateleiras entre as árvores com estes produtos? (indago eu, brincando com Poti).
- Prateleira?!?! O que é isso?
- Nas cidades grandes existem locais com... tábuas retas com produtos em cima identificados para escolhermos o que queremos.
- Isso não tem na floresta...!!!! Isso é coisa de homem branco...! Assim você não conseguirá ser índio...!

Neste momento Pedro entra novamente no quarto, agora vestido, e comenta o assunto levantado pela menina:

- Escorpiões, cobras, aranhas, rãs venenosas, lagartas, plantas que matam, são dezenas de coisas na floresta que podem acabar com a sua vida.
- Você é índio, Pedro? (indaga Poti).
- Eu? Sou descendente! Vivi mais tempo no mato do que em sociedade! Conheço muito bem o que é sobreviver numa floresta, mas não sei mais o que fazer dentro de cidades.
- Fernando! Fala com o Pedro para te ensinar como viver na floresta...! (sugere Poti).

- Talvez algum dia o sargento Pedro possa me ensinar algumas coisas! (indago eu).
Pedro rapidamente deita-se em minha cama e vira-se para o lado da parede.

- Sargento...! Esta cama aí é a minha...! (digo eu, Fernando, a ele).
- Não tem problema, jornalista! Já me acostumei a dormir em qualquer lugar...!

Já deitado Pedro olha para cima e vê uma espuma colada na parte debaixo da cama de cima do beliche. Ele olha em minha direção espremendo olhos e lábios, porque não gostou daquilo. Num gesto rápido ele arranca a espuma e a joga no chão, virando-se imediatamente de lado para dormir. Eu observo com dó pelo que ele fez. Agora sei que terei muitas dores de cabeça nas próximas noites. Rapidamente Pedro entra em sono profundo...! Seu cansaço físico e psicológico deve ter sido enorme nos últimos dias fora as noites mal dormidas! Mas o meu maior problema neste momento é: onde é que eu irei dormir?

- Ele já dormiu???? (indaga Poti a mim).
- Ele está muito cansado! E ao que parece eu ficarei de vigília hoje! (digo eu a ela).
- Por quê?
- Nada não! Vai dormir, Poti! Amanhã de manhã estaremos em Manaus! Lá um médico irá falar com você!

Ela vira-se de lado e enquanto eu me levanto dali, Bola-de-pelo se aproxima e dá um salto para ficar ao lado de Poti durante a noite. Um faz companhia ao outro. As horas vão passando e Sabino e Everardo também vão dormir! Eu continuo na mesa da cozinha trabalhando em meu tablet! Uma hora da manhã! Não aguento mais! Agora a minha cabeça já não para mais em pé! A banqueta da cozinha não tem encosto! Assim só me restou me equilibrar enquanto tento escrever. Por várias vezes acordo assustado e ao olhar para a tela vejo centenas de letras exatamente iguais. Meu dedo dormiu sobre o teclado do computador. Tento me manter firme! Mas a única firme neste momento é a vontade de dormir.

Desligo tudo e vou para o quarto. Vejo que o sargento Pedro está ali, em minha cama. Eu tinha até me esquecido disso! Olho para cima e vejo Sabino e Everardo nas outras camas. Embaixo está Poti e Bola-de-pelo. Não tenho escolha! Restou-me o chão ou tentar dividir a pequena cama com uma criança e uma onça! Decisão difícil! Deitei-me no chão entre os dois beliches. Fiquei olhando para cima e imaginando alguma emergência acontecendo lá fora. Lembrei-me que os dois cabos saltam rapidamente da cama no chão... exatamente no lugar em que eu estava deitado...! Péssima ideia dormir ali...! Mas o quarto é pequeno e não há outro lugar para fazer isso...! Vou ter que dividir a pequena cama.

Deito-me de costas para os dois ali instalados porque quero deixar meu nariz bem longe daquela... Bola-de-pelos... que sempre me faz espirrar. Quando consigo lentamente me ajeitar, já quase caindo da cama... o longo rabo do filhote de onça começa a balançar atrás de mim. Tal qual um cachorrinho ele parece feliz de eu estar ali com ele. Dou um breve sorriso para o evento. Aos poucos o filhote sai dali e se reposiciona perto de minhas pernas onde sobrou mais espaço para ele. Poti vira-se para o meu lado e me abraça por trás agarrando em meu pescoço. Ela está me enforcando suavemente. Eu a ouço falar sozinha e sonolenta:

- Boa noite, mamãe!

Sorrio novamente para esta situação. Parece que me formei em jornalismo para escrever matérias que ninguém lerá tão cedo e ainda criar uma onça e uma indiazinha! Poti, mesmo sonolenta, tem razão: acho que virei mãe dos dois! Não vou acordá-la! Eu consigo dormir com uma criança me enforcando! Eu acho...! Mas meu sono é muito grande! Rapidamente eu apago! A viagem pelo rio é tranquila e os muitos roncos deste quarto devem ser os mais fortes barulhos da floresta naquela noite. As horas passam e o dia amanhece inesperadamente para mim, quando o comandante do barco invisível nos acorda com um:

- Bom dia, tripulação!

Eu acordo assustado e tento me sentar na cama, mas... como sempre..., acerto a minha cabeça com força no beliche de cima. Sabino e Everardo saltam rapidamente de lá de cima, como sempre..., e Pedro também acorda assustado fazendo o mesmo que eu: batendo com força a cabeça no estrado da cama acima dele.

- Bem-vindo ao meu clube! (digo eu ao sargento Pedro).

Estamos os dois com fortes dores de cabeça nesta manhã. O Bola-de-pelo já estava ali perto deitadinho no chão e me aguardando para preparar a comida dele. Poti já não estava mais na cama.

- Onde pode estar esta menina?

Indago eu como se ela tivesse muitos outros locais para estar...! Inesperadamente eu e o sargento nos levantamos juntos da cama e batemos de frente!

- Ai! (novas dores de cabeça mútua).
- Você é sempre tão atrapalhado assim? (indaga Pedro a mim).
- Como assim, sargento...? Até a noite passada eu estava bem...! Sem dores de cabeça...! Ai!

O sargento agora se levanta na frente e se afasta dali com uma das mãos na cabeça! Eu logo a seguir me levanto e também com uma das mãos na cabeça. Diazinho difícil!

- Bom dia a todos! (declara a voz feminina e suave da inteligência artificial). Fernando! Acho melhor você ir falar com Poti! Ela está brincando na sala de manutenção. Se ela mexer em alguma coisa poderemos ter sérios problemas como, por exemplo, a liberação de radiação nuclear por toda a embarcação.

- O quê? Está falando sério? (indago eu, preocupado).
- Claro que não!!!! É brincadeira!!!!
- Ahhh! Tá! Eu ainda não acordei! Preciso de um tempo para começar a funcionar direito!

- As pesquisas dizem que adolescentes têm dificuldades em acordar cedo, mas você não é mais adolescente. Talvez exista alguma disfunção em seu relógio biológico! (declara o supercomputador). Eu lhe emprestaria o meu, mas preciso dele a cada segundo!

- Engraçadinha logo cedo? (indago eu, enquanto me encaminho ao banheiro).
- É uma técnica psicológica para fazê-lo raciocinar logo cedo e com isso acordar mais rápido também!
- Entendi! Está esperando que eu lhe agradeça primeiro ou ache graça da piada?
- Como quiser, mas acorde logo, Fernando, já estamos chegando ao porto secreto de Manaus!
- Tá! Entendi! Então depois eu sorrio! Obrigado por me ajudar a acordar!
- De nada!

Lá fora o nosso barco invisível entra pelo canal estreito do rio entre altas árvores que recobrem as duas margens no local. Navegamos invisíveis e lentamente até chegar ao ponto de acesso na margem esquerda. O sistema hovercraft é acionado e a nossa embarcação se ergue ligeiramente das águas. Avançamos sobre a estreita praia disponível apenas para nós ali. Agora tudo é desligado e o barco se abaixa até encostar suavemente no arenoso solo do porto seco secreto da marinha.

- Bom dia, pessoal! Vocês têm cinco minutos para sair do interior da embarcação! (informa o comandante Severo). Nossa equipe já está lá fora para iniciar a inspeção e abastecer a dispensa! Precisamos dar espaço a eles. Enquanto se aprontam quero dar um recado muito importante. Recebemos a informação de que houve um intenso tiroteio e disparo de mísseis na cidade de Hobyo na Somália. Os americanos nos informaram que eles estavam acompanhando tudo via satélite e notaram que um grupo que usava roupas negras invadiu a cidade e roubou grande quantidade de armas. Tudo foi levado para o mar e lá os pequenos barcos a motor desapareceram. Tudo indica que o nosso inimigo invisível norte-coreano está se preparando para uma guerra. Acreditamos que estão vindo em nossa direção. Assim que terminarem o que devem fazer aqui em Manaus vocês deverão partir imediatamente para a costa brasileira. Devem monitorar os possíveis rastros de nosso inimigo antes que ele faça algo muito ruim por aqui. Quero lembrá-los de que uma das bombas nucleares não foi encontrada na extinta Coreia do Norte. Estamos prevendo o pior: o barco invisível inimigo pode querer detoná-la contra nós. A missão de vocês é localizá-lo, interceptá-lo e destruí-lo antes que ele detone tal armamento. O fato dele estar se armando pode significar muitas coisas! Nossa inteligência vem avaliando as possibilidades. É só, por enquanto! Assim que soubermos mais informaremos a vocês. Agora acelerem o passo!

Rapidamente estamos todos saindo dali de dentro. Estou de volta ao local onde vi pela primeira vez este maravilhoso barco invisível. Ao descer vejo ainda da porta de saída dois jipes e lotados de materiais e mantimentos e sempre os quatro soldados que são enviados exclusivamente para a manutenção de nossa embarcação militar. Pedro, Sabino e Everardo já estavam lá fora conversando com os colegas e ajudando-os a descarregar os veículos.

Poti vem atrás de mim com Bola-de-pelo no colo e uma cordinha no pescoço dele para não fugir de nós pela mata selvagem. Eu pego a indiazinha no colo e nós três descemos juntos e cuidadosamente pelas escadas sem corrimão. O barco invisível está visível neste momento. E eu me aproximo dos jipes. Poti, em meu colo vai fazendo perguntas como toda criança:

- Onde estamos?
- Estamos em Manaus, Poti! Você já veio a Manaus antes?
- Às vezes. Meu pai vendia diversas coisas da aldeia aqui!

Ao longe eu ouço uma das conversas de um dos quatro soldados recém-chegados com Everardo:

- Trouxemos diversos dispositivos especiais para vocês usarem contra o inimigo em pleno mar. Já enviamos um vídeo de treinamento de como usar tais dispositivos para o supercomputador de bordo de sua embarcação. Qualquer dúvida entre em contato conosco que lhes ajudaremos!

- Tá! Obrigado! (agradece Everardo, cumprimentando o colega militar).
- Olá, Fernando! É bom vê-lo novamente! (diz um dos soldados que vieram para a manutenção e abastecimento).
- Olá! Como tem passado? (respondo eu).
- Tudo bem...! Vejo que a família está crescendo...! Já tem uma filha e um animal de estimação!!!!
- Ahhh! Não...! Ela não é minha filha...! E o Bola-de-pelo não é de estimação...!
- Para mim vocês parecem uma pequena "grande família feliz"...! Até mais, garotinha...! (diz o soldado passando a mão na cabeça de Poti e pegando uma enorme maleta para levá-la para o interior do barco invisível).
- Fernando! Venha! Entre no jipe! (grita para mim, Everardo). Vamos até a recepção do exército. Cristina e um psicólogo da FUNAI estão nos aguardando lá para ver seus dois filhos!

Eu olho para Poti enquanto ando até o jipe e digo a ela:

- Parece que todos querem nos transformar numa única família! (digo eu sorrindo para ela).
- Não tenho ninguém! Só você! (diz ela a mim..., partindo meu coração).
- Eu sei, Poti! Mas o pessoal da FUNAI vai lhe tratar muito bem! Você voltará a enxergar muito em breve!
- Você não quer ficar comigo? (me diz ela, o que me deixa sem uma boa resposta para isso).
- Não é isso, Poti...! Eu não tenho onde morar no momento...! Estou viajando o tempo todo...! Não tenho como cuidar de você...!
- Eu posso morar no barco invisível!
- Invisível? Quem lhe disse isso?
- Eu ouço conversas! Escuto bem! Na floresta conheço os sons do dia e da noite que os animais fazem!
- Ahhh...! Éééé...? Então vou te contar um segredo, mas não pode espalhar para ninguém..., tá?

Ela balança a cabeça afirmativamente e sorrindo levemente enquanto leva uma das mãos à boca com fazem normalmente as crianças!

- Assim que eu terminar a minha próxima missão retornarei aqui só para te visitar, tá? E neste dia nós dois vamos conversar bastaaaante! Tá bom?

Ela balança a cabeça afirmativamente mais uma vez e sorri para mim. Entramos todos nos jipes, deixando no porto apenas os quatro soldados que devem terminar o serviço e aguardar o nosso retorno. A estrada é meio ruim e de terra batida o que faz chacoalhar muito o veículo! O vento balança meus cabelos. Há muito não sinto tal coisa. Dentro do barco não há vento nem ruídos externos. É uma sensação muito boa. Bola-de-pelo está meio agitado! Vendo tantas árvores talvez ele imagine que sua mãe esteja por ali, em algum lugar, esperando por ele!

Rapidamente chegamos à sede e recepção do exército de Manaus. Desta vez Sabino pegou nosso filhote de onça no colo, e eu, a pequena Poti. Ao abrir a porta da entrada vejo apenas uma simpática e bela mulher, que ao ver o Bola-de-pelo, parece que se desmanchou em sorrisos e amor por ele.

- Que coisinha mais linda e fofa, gente! (declara ela todo o amor que sente pela espécie animal enquanto o pega no colo imediatamente). Ele é bem novinho ainda...! Está meio magro...! Pelo jeito foi tratado com leite de vaca, né?

- Sim! É verdade! (digo eu). Era a única coisa que tínhamos para oferecer a bordo de nosso barco militar.
- Olá! Eu sou o cabo Sabino! Este é o cabo Everardo, o sargento Pedro, o jornalista Fernando e a pequenina Poti!

- Olá a todos! Linda a sua filha, Fernando! Meu nome é Cristina e tenho uma fazenda onde montei uma ONG chamada NEX, que tem um criadouro conservacionista no município de Corumbá de Goiás! Transformei o local num centro de cuidados, defesa, auxílio e preservação de felídeos da fauna silvestre do Brasil que estão em processo de extinção.

- Então a senhora acha que o Bola-de-pelo será bem tratado em sua fazenda? (indago eu, Fernando).

- Eu acho, não! Eu tenho certeza! (responde Cristina). Lá nós tratamos com carinho e amor cada um de nossos "hóspedes". Eles vêm normalmente de situações muito ruins. Alguns são criados como animais de estimação. O IBAMA os leva para nós e fazemos de tudo para eles voltarem a agir conforme a espécie deve agir. Envolvemos a comunidade próxima e promovemos a educação ambiental, protegemos as nossas florestas e a fauna silvestre. Estamos em funcionamento desde 2000. Temos licença ambiental do IBAMA para poder trabalhar com os animais. Levamos para lá onças que começaram a caçar o gado das fazendas. Nós as capturamos para que os fazendeiros não as matem.

- O Bola-de-pelo teve a mãe morta durante um confronto entre guerrilheiros e fazendeiros próximo à fronteira do Brasil com a Colômbia (declara Everardo). Nós o resgatamos e o trouxemos para cá!
- Ele será treinado para viver livre novamente? (indago eu, Fernando).

- Não! Infelizmente não temos como fazer isso! (responde Cristina). Quando são retirados da natureza ainda filhotes eles perdem a oportunidade de aprender a caçar sozinhos. A mãe lhes ensina tal coisa! Nós não podemos fazer isso! Mas fazemos o máximo para que vivam o mais próximo possível da vida livre que tinham.

- Então ele viverá preso para sempre? (indaga Everardo).
- Sim! Também ficamos chateados com isso, mas não podemos fazer nada melhor do que isso por eles (comenta Cristina com o olhar um pouco triste neste momento). O nosso consolo é que em nosso centro eles vivem muito bem! Estamos sempre aprendendo com eles. Fazemos tudo ao nosso alcance para que cada animal viva bem, feliz e saudável!

- Entendo! (digo eu). Poderei visitá-lo no futuro?
- Claro que sim, Fernando! Quando quiser!
- Mas será que ele se lembrará de mim?

- As onças têm uma memória fantástica e uma capacidade incrível para aprender a fazer as coisas. Eles aprendem sozinhos a pescar dentro d´água, aprendem a abrir as trancas das jaulas e muitas outras coisas! São muito inteligentes e espertos. Tenho certeza de que o Bola-de-pelo se lembrará de você!

- Muito bem, então! E onde está o psicólogo? (indago eu).

Ele acaba de entrar na sala!

- Desculpe-me, pessoal! (declara a psicóloga). Eu estava conversando com o coronel e me atrasei...! Ahhh...! Então esta é a famosa Poti?

A menina põe uma das mãos na boca, demonstrando alguma preocupação com o que se seguirá daqui para frente.

- Poti! Meu nome é Elisa! Gosta de brincar...? Hein...?

A menina nada diz e demonstra insegurança no colo de Fernando.

- Eu tenho um montão de jogos para você em meu consultório! Quer ir lá conhecer...?
- Poti! Eu preciso ir embora! (digo eu, Fernando a ela). Mas não se esqueça de nosso segredo! Assim que eu terminar a próxima missão volto aqui para te ver! E espero que você possa também me ver!

Poti, ainda em meu colo, vira-se para mim e com as duas palmas das mãos vai percorrendo todo o meu rosto suavemente.

- Que gostoso...! (digo eu) O que está fazendo...?
- Decorando! Quando voltar, vou saber se é você mesmo que virá aqui ou algum amigo invisível seu!
- Rsrsrs! Não se preocupe! Eu mesmo virei te visitar em breve! Prometo! Agora eu quero que você seja uma boa amiga da doutora Elisa e faça o que ela te pedir, tá bom...?
- Sim, Fernando!

Ela agora me beija no rosto e me abraça forte por longos vinte segundos. Aquilo me comoveu e uma lágrima escorreu pelo meu rosto. Apeguei-me àquela criança tão inteligente e esperta! Como farei para me afastar dela? Acho que a minha vida de repórter está me levando para caminhos inesperados! A história que eu deveria narrar e observar imparcialmente, está me agarrando e me envolvendo de um modo do qual não consigo me eximir! E este é apenas meu primeiro ano de trabalhos na marinha! O que me reservará os próximos quinze anos?

Todos nós deixamos o local e retornamos para o barco invisível para a próxima missão! Menos o sargento Pedro! Este pegará um avião direto para Brasília para uma reunião com o general Figueiredo.

CAPÍTULO IV
PEDRO E O LOBO

CAPÍTULO XXVII
LAR DAS ONÇAS

CAPÍTULO V
FANTASMA URBANO

CAPÍTULO XXVIII
O INFERNO CONTRA-ATACA

CAPÍTULO VI
PIRATAS INVISÍVEIS

CAPÍTULO XXIX
ATAQUE AO LITORAL

CAPÍTULO VII
ENTRANHAS DO PODER

CAPÍTULO XXX
NOVOS POLÍTICOS

CAPÍTULO VIII
FRONTEIRAS DA GUERRA

CAPÍTULO XXXI
LEMBRANÇAS ANTIGAS

CAPÍTULO IX
BALAS ASSASSINAS

CAPÍTULO XXXII
O DONO DO INFERNO

CAPÍTULO X
FICHA LIMPA OU ROUPA SUJA

CAPÍTULO XXXIII
AGULHAS INVISÍVEIS

CAPÍTULO XI
PIRATAS EM REUNIÃO

CAPÍTULO XXXIV
VISITA INTERNACIONAL

CAPÍTULO XII
PRESSÃO POLÍTICA

CAPÍTULO XXXV
SOZINHO NA MULTIDÃO

CAPÍTULO XIII
GUERRA SEM-FIM

CAPÍTULO XXXVI
GUERRA DE INVISIBILIDADE

CAPÍTULO XIV
NAS PISTAS DE UM COMBATE

CAPÍTULO XXXVII
VERDADE DOS FATOS

CAPÍTULO XV
ENTREVISTA COM O DEMÔNIO

CAPÍTULO XXXVIII
PALAVRA DE PRESIDENTE

CAPÍTULO XVI
MOGADÍSCIO

CAPÍTULO XXXIX
O ENCONTRO COM O MAL

CAPÍTULO XVII
O AMANHÃ COMEÇA HOJE

CAPÍTULO XL
TIRO NO ESCURO

CAPÍTULO XVIII
MORTE NA ALDEIA

CAPÍTULO XLI
PARCERIA INUSITADA

CAPÍTULO XIX
FRONTEIRA DO PODER

CAPÍTULO XLII
ESPELHO QUEBRADO

CAPÍTULO XX
FALSO FANTASMA

CAPÍTULO XLIII
O NOVO CÂNCER

CAPÍTULO XXI
LADRÃO QUE ROUBA LADRÃO

CAPÍTULO XLIV
LEMBRANÇAS DO VIETNÃ

CAPÍTULO XXII
DOMÍNIO DO ÓBVIO

CAPÍTULO XLV
A VERDADEIRA DEMOCRACIA

CAPÍTULO XXIII
CORONEL SEM ESTRELA

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Abaixo a imagem da cidade de Corumbá de Goiás, perto da qual fica a ONG NEX de Cristina Gianni, onde diversos felídeos são cuidados com amor e carinho.
É um lar disponível para proteção, educação ambiental e preservação. São hoje oito principais felídeos em risco de extinção:
onça pintada, onça suçuarana, jaguatirica, gato maracajá, jaguarundi, gato palheiro, gato do mato grande e gato do mato pequeno.