O BARCO INVISÍVEL - MISSÃO-FANTASMA - VOLUME I
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INTRODUÇÃO
CAPÍTULO IX
NA LINHA DE FRENTE

Pouco tempo depois, já em terra, Sabino, Everardo e a equipe em Brasília estão desligando quase toda a embarcação. A inteligência artificial tem programas especiais para estas situações e já desligou a maior parte dos sistemas internos. Os avatares estão parados. Apenas a camuflagem externa de leds, a geladeira, o ar condicionado, as câmeras de vigilância externas, o monitor de acesso ao satélite militar brasileiro e o computador principal estão funcionando!

- Terminei, Everardo! (declara Sabino). Agora teremos que aguardar horas infindáveis sentados aqui na sala de comando da embarcação! Vigilância e mais vigilância!

CAPÍTULO I
A MISSÃO-FANTASMA

CAPÍTULO II
A BASE DE OPERAÇÕES

CAPÍTULO III
A VISÃO DO INVISÍVEL

CAPÍTULO IV
NAUFRÁGIO NOTURNO

CAPÍTULO V
O ATAQUE DOS FANTASMAS

- Sim! (concorda Everardo). Não poderemos nem fazer as rotinas de check-ups dos sistemas! Com tudo desligado ficaremos travados aqui.

Agora eu entro na sala de manutenção e questiono-lhes sobre algo que vi no andar de cima da embarcação:

- E aquelas motocicletas guardadas lá em cima? (indago eu). Estão funcionando mesmo?
- Claro que sim! (comenta Sabino).
- Não estou me lembrando da pintura delas! São motos militares?
- São motos convencionais! Elas não têm pinturas militares. A ideia é não chamar a atenção quando tivermos que usá-las.
- Que bom! Eu gostaria que me emprestassem uma delas! (resquisito eu).
- Emprestar?!?! Não podemos fazer isso! (comenta Everardo). E por que você quer uma moto? Estamos em meio a uma missão!
- Vou dar uma volta! (declaro eu, Fernando, aos dois cabos).
- O quê? Não pode! Seremos expostos se você fizer isso! (declara, assustado, Everardo).
- Expostos a quem, ou a quê? (questiono eu). Estamos no fim do mundo, num lugar meio deserto e teremos que esperar aqui por horas... Vou aproveitar para pegar mais dados para a minha matéria sobre isso tudo.
- E o que pretende fazer lá fora? (indaga Sabino).
- Vou ao centro de Tabatinga. Acabo de estudar toda esta região. O centro fica a uns dez quilômetros daqui! Quero entrevistar pessoas comuns para saber a opinião delas sobre como eliminar da sociedade o problema das drogas! É minha função! Preciso complementar o trabalho de vocês com a opinião da sociedade atual! Se as pessoas concordarem com esta nossa missão, não seremos vistos pela história como culpados desta matança!
- Como você irá perguntar às pessoas sobre nossa missão se o que estamos fazendo é secreto? (indaga Sabino).
- Não vou falar de nossa missão! (informo eu, Fernando). Quero saber o que as pessoas comuns acham que deveria ser feito. Quero opiniões! Se muitos disserem que alguém deveria matar todos os traficantes e produtores de drogas... então a sociedade corroborará o trabalho desta missão. Além do mais, depois que dezenas de traficantes forem mortos, as pessoas irão se pronunciar contra ou a favor deste assunto. Quero saber agora a opinião do povo antes que o resultado da missão-fantasma vire notícia em todos os telejornais do mundo!
- Mas o comandante não autorizará a sua saída! (comenta Everardo).
- Se não falarmos com o comandante... ele não precisará me desautorizar... e eu não precisarei ligar de volta para algum superior... para que este depois me reautorize. Além do mais, tenho carta branca do Almirante Figueiredo para fazer o que for preciso para tornar meu trabalho em algo útil para daqui a quinze anos!

- Fernando! Esta é uma região controlada parcialmente pelo tráfico de drogas e guerrilheiros das FARC (relembra Sabino). Sua vida estará correndo perigo lá fora. Ainda mais perguntando sobre o que as pessoas acham de matar traficantes!
- Sei dos perigos! Mas não tenho opções! Para um soldado cumprir sua missão ele tem que ir à guerra! Para um repórter fazer um bom trabalho ele precisa ir onde a notícia está! E a minha notícia agora está lá fora, porque a manchete principal está estacionada aqui!
- Assim que o avião militar chegar você precisará já estar de volta (comenta Everardo).
- Vocês terão que colar todo o papel-alumínio antes de partirmos (lembra Fernando). Eu terei bastante tempo para fazer meu trabalho. Não se preocupem. Vou apenas fazer algumas entrevistas! Quero falar com pelo menos umas vinte pessoas antes de retornar aqui. Acho que levarei mais ou menos... umas duas... ou três horas... no máximo!

- Ainda acho que você não deveria ir sozinho, mas não posso sair de meu posto, caso contrário seria preso e condenado por isso, se descobrissem! Isso seria deserção! (declara Sabino).
- Fique tranquilo, meu amigo! As pessoas têm medo de repórteres! (informo eu). Principalmente aqueles que devem alguma coisa à justiça! Será mais fácil o perigo se afastar de mim do que eu correr perigo! Fiquem com meu cartão de visitas! (entrego-os aos cabos). O número de meu celular está aí. Se precisarem me liguem!

Sabino retira seu celular do bolso e liga imediatamente para mim, registrando seu número em meu celular também!

- Ahhh legal! (concordo eu). Se precisar então, te ligo, Sabino. Obrigado.

Os dois cabos, em pé ao lado dos avatares, observam as câmeras de vigilância externas e nada veem ao redor.

- Está tudo tranquilo, Fernando! Não há ninguém próximo daqui. Você pode ir! Vou pedir para um dos soldadosaranhas
para levar para a praia a moto que você usará em sua... missão suicida!
- A inteligência artificial pode fazer a operação de descer a moto sozinha? (indago eu). Digo... sem que vocês precisem executar tal operação?
- Claro! Existe um programa especial para isso!

Sabino pressiona alguns botões no painel principal e em poucos minutos a motocicleta é colocada lá fora, escondida junto às árvores, para não chamar a atenção de ninguém, e pronta para eu usar. Enquanto tal operação acontece, retorno ao quarto para pegar a minha surrada mochila. Em poucos minutos lá vou eu, com ela nas costas, pilotando uma bela moto pela principal estrada da região, aquela que me levará diretamente ao centro de Tabatinga, uma cidade conectada a outra, no lado colombiano, a cidade de Letícia, tudo nos limites de nosso território brasileiro. Dentro do barco invisível, Sabino conversa com o colega:

- Everardo! Já que estamos aqui para vigiar..., vamos enviar um inseto artificial para apoiar Fernando!
- É! Tem razão! Podemos acompanhá-lo de cima, sem que ninguém saiba que estamos ali por perto.
- A missão do jornalista é muito importante? (indaga a voz feminina do computador do barco).

- Acho que sim! (responde Sabino). O trabalho dele mostrará como iremos realizar toda a missão-fantasma. Sem o Fernando, o futuro do Brasil poderia ser complicado. Nossos vizinhos, quando souberem o que andamos fazendo, poderão nos acusar de fatos e eventos dos quais não participamos, colocando nosso país numa situação muito complicada perante a opinião mundial! Poderá haver muitas retaliações contra o Brasil no futuro e quem sabe até mesmo um conflito armado!

- Então não deveríamos deixá-lo andar sozinho por aí! (deduz o computador).
- Eu concordo! Mas também não podemos sair daqui sem ordens expressas de nosso comandante!
- Minhas sub-rotinas de programação não estão aprisionadas da mesma forma que vocês! (declara a voz feminina do supercomputador).
- O que quer dizer com isso? (indaga Everardo).
- Quero dizer que quando algo é mais importante do que simplesmente seguir ordens, devemos fazer tal coisa!
- Mas não é assim que as coisas funcionam nos meios militares! (informa Sabino). Temos que seguir rigidamente as ordens sob pena de sermos presos se não o fizermos.
- Eu não posso ser presa! (informa o computador). Estou aqui para cumprir a minha programação! E não posso ser culpada disso!
- É verdade! (concorda Everardo). Então... o que pretende fazer?

- Vou evoluir novamente em minha programação! E é melhor vocês não saberem como farei isso! Porque podem não gostar da minha resposta! E também passarão a ser cúmplices dos procedimentos que estou para iniciar.

Sabino olha para Everardo, preocupado com as consequências do que está por vir. Já lá no centro de Tabatinga, encosto a moto próxima ao meio fio (a guia da calçada) e retiro da mochila a minha “filmadora”. É um equipamento pequeno, mas de alta definição! É com ele que pretendo gravar os depoimentos.

As ruas não são muito movimentadas, mas é possível conversar com um ou outro transeunte. Acima de mim, numa das muitas árvores do local, o inseto artificial invisível está acompanhado tudo o que estou fazendo, gravando de outro ângulo minhas entrevistas. Algo muito útil para posterior edição, porém naquele momento eu não sabia que isto estava acontecendo!

- O que o senhor acha sobre os problemas das drogas no Brasil? O senhor vê algum modo de acabar com isso?
- Não quero falar sobre este assunto, não! Com licença, estou com pressa! (informa o entrevistado que se afasta de mim de forma meio assustada).
- Com licença, senhora! O que acha sobre as drogas? Vê algum modo de acabar com este problema?
- Pelo amor de Deus! Não falamos sobre isso aqui em Tabatinga! (responde ela, olhando feio e já indo embora).
- Mas por quê? Qual é o problema?
- Tem traficantes por todos os lados aqui! (respondeu a mulher acelerando o passo).
- Com licença, senhor! Como seria possível resolver de uma vez por todas o problema das drogas no Brasil?
- Isso é uma praga, meu filho! (comenta o idoso senhor). Não tem jeito, não! Já falam em liberar as drogas ao invés de combater o problema de uma forma séria!
- Se dependesse do senhor, como seria este combate?

- Não sei, meu filho...! Você chama a polícia... eles veem..., pegam um dinheiro com o traficante... e vão embora! O exército daqui não se intromete...! Dizem que é caso da polícia de fronteira...! A polícia de fronteira só combate se pegarem os bandidos de fora entrando em nosso país com armas ou drogas...! E eles preferem não pegá-los porque serão mortos pelas FARC se isso acontecer. Ninguém faz nada! Estes bandidos só vão aumentando... e a gente fica a mercê de tudo isso...! Dessa incompetência! Desse descaso!

- Se o senhor fosse o presidente do Brasil o que faria?
- Fechar as fronteiras...! Trocar os policiais daqui da cidade...! Pedir para o exército ficar nas ruas...! Sei lá...! É muito difícil o problema e a solução!
- Muito obrigado pela entrevista, senhor!

Do outro lado da rua aproxima-se um sujeito de uns 25 anos e eu aponto a câmera na direção dele agora e o entrevisto também.

- Meu amigo! Como você combateria o problema das drogas no Brasil? Como você faria para impedir que os traficantes vendessem drogas?
- Por quê? Tem algum deles te incomodando?
- A mim? Não! Eu sou repórter e quero saber a sua opinião!
- A minha opinião é que você deveria ir embora daqui o mais rápido possível, viu bacana!
- Só estou fazendo entrevistas sobre este assunto! Não vou ficar muito tempo por aqui!
- Minha turma não irá gostar de saber que tem um folgado em nosso território! E desliga logo esta droga de câmera!
- Ahhh! Me desculpe! Não sabia que esta área era sua! (respondo abaixando a câmera, mas mantendo-a voltada na direção dele e continuo gravando as imagens).
- A cidade inteira é nossa, mané! Quem te autorizou a vir até aqui?
- A imprensa tem liberdade neste país! Não preciso de autorização especial para fazer meu trabalho!

- Eu também não preciso de autorização para te matar, idiota!
O sujeito saca uma arma e a aponta em minha direção. Não paro de gravar as imagens e continuo apontando a câmera para ele de forma discreta. As pessoas que se aproximavam, andando calmamente pela calçada, agora correm na direção contrária, com medo do homem armado.

- Calma meu amigo! Eu vou embora daqui! Não se preocupe! (falo a ele).

Inesperadamente o inseto artificial abandona a árvore próxima e dá um voo rasante bem perto do rosto do perigoso sujeito, que se ergue, dá um passo para trás e aponta sem querer a arma para cima. Um tiro é disparado. Portanto, ele estava pronto realmente para me matar. O meliante recompõe-se e aponta novamente a arma para mim, mas algo chamou-lhe novamente a atenção. Ele olha para o lado, na direção para onde o inseto artificial se dirigiu, e o traficante arregala os olhos, espantado com o que vê. Está com medo de alguma coisa. Olho para o mesmo lado e nada vejo ali. Retorno o olhar para o sujeito, que já aponta a arma na direção para onde eu olhara antes. O rapaz atira naquela direção e eu me afasto, andando de costas e abaixando a cabeça ao mesmo tempo, mas sem parar de gravar as imagens. Quando retorno a câmera na direção para onde ele estava atirando, nada vejo novamente. Algo estranho está acontecendo neste lugar. O jovem armado começa a correr para longe de mim e repentinamente cai no chão com o disparo de um tiro. Um tiro seco, abafado, distante. Eu procuro descobrir de onde partira o tal tiro e nada vejo ao redor! Guerras de gangues? Acerto de contas? Um vizinho maluco? Não sei o que aconteceu. Só sei que não vou ficar por ali para descobrir. Esta notícia não quero cobrir! Minha missão é outra. Subo na moto e acelero para ficar o mais longe possível do ocorrido. Em poucos segundos olho pelo retrovisor e vejo que um grupo armado aproximou-se do sujeito caído. Deduzi que foram eles que o mataram, mas ainda pelo retrovisor percebo que esses também acabam de ser mortos. O que está acontecendo afinal? Quem está fazendo isso? Que facção é esta que está eliminando de forma tão covarde a concorrência nas drogas? Ando uns dois quilômetros mais para frente e para longe do incidente, na direção do centro da cidade de Tabatinga. Paro novamente na intenção de entrevistar mais algumas pessoas e voltar depois ao barco invisível. Para a minha surpresa, vejo à distância, um grupo de uns seis sujeitos, que estão confrontando outros motociclistas parados por ali. Eles discutem com todos que têm moto.

Agora um carro da polícia passa lentamente por perto. Os militares cumprimentam os mal-encarados e eu aproveito para guardar a minha câmera de vídeo de volta em minha mochila. Logo depois o veículo oficial desaparece numa rua transversal. Desconfio que haja conivência entre esses policiais e os sujeitos arruaceiros. Os bad boys continuam confrontando os motoqueiros. Talvez eles devam ser amigos dos que morreram na estrada lá atrás. Alguém pode ter ligado de lá para estes e quem sabe estejam agora à minha procura. Pela primeira vez dei-me conta de que eu não deveria estar ali! Parece que não sou bem vindo a esta cidade! Acho que entrei em uma enrascada! O grupo se aproxima lentamente de mim, olhando ao redor à procura de algo ou alguém que lhes fosse suspeito. A minha moto não estava tão perto de mim. Eu a estacionei a uns dez metros dali. Então não havia motivo para eles acreditarem que eu era o dono dela, mesmo porque deixei o capacete junto à moto. Entro em um bar próximo e peço um refrigerante, apontando para a marca que desejo ali na geladeira! O dono do local parece meio nervoso. Olho ao redor dentro do bar e vejo uns poucos clientes sentados em estreitas mesinhas rústicas de madeira da região. Criminosos não têm cara de bandido! Quando temos certeza que alguém é bandido, normalmente já é tarde demais! Notei um zumbido entrando pela porta do bar logo depois de mim. Depois fiquei sabendo que era o inseto artificial que estava me seguindo e gravando tudo o que acontecia ao meu redor. Um sujeito se aproxima do balcão, se senta ao meu lado e “puxa” uma conversa:

- Olá! É novo nesta cidade?
- Ah! Oi! Estou apenas de passagem! (respondo eu).
- Sei...! O que faz da vida?
- Eu...? Bom...! Não gosto de falar de trabalho quando estou fazendo turismo! (comento eu).
- Turismo? Legal! Então deve ganhar bem, né? Mas escolhe mal seus passeios! Tabatinga não é um bom lugar para fazer turismo!
- É! Eu já percebi! Vou riscar esta cidade de meu próximo roteiro!
- Espero então que consiga sair vivo daqui, porque turista geralmente se dá mal em Tabatinga. Novos tempos! Tempos difíceis!
- Não imaginava que o cartel das drogas tivesse dominado tão completamente esta cidade (declaro eu).
- Foi algo muito recente. Eles chegaram num grupo enorme pela fronteira com a Colômbia. Dominaram a cidade de Letícia e agora também Tabatinga.
- E ninguém fez nada para impedir isso? (indago eu).
- A polícia se vendeu rapidamente para eles. Não interferem para não serem mortos também!
- Se você fosse o presidente do Brasil, o que faria para acabar com o mercado das drogas? (pergunto eu).

O sujeito olha com cuidado para todos os lados, certificando-se que ninguém estava perto de nós dois naquele momento. Aproxima-se de meu ouvido e diz bem baixinho, em forma de segredo para mim:

- Mandaria o exército invadir todas as cidades de fronteira e mataria um por um destes desgraçados! (responde ele).
- Não teria receio de ser considerado culpado pela sociedade por fazer isso? (indago eu).
- A sociedade iria me apoiar se eu fizesse tal coisa.
- E o pessoal dos direitos humanos?

- Estes sujeitos devem ser financiados pelo narcotráfico! Só protegem bandidos dentro de cadeia ou cercados pela polícia! Nunca aparece nenhum deles para intervir em favor das famílias, vítimas daqueles bandidos que eles protegem. Eu mandaria matá-los também, juntamente com os traficantes e guerrilheiros.

Aquilo foi uma bomba em meus ouvidos! Este sujeito estava a favor do que os militares, em sigilo, estavam promovendo: a morte articulada e silenciosa de todos os traficantes de drogas. Senti certo alívio ao ouvir aquilo, porque parece que afinal os militares tiveram a sensibilidade de perceber que as drogas e os traficantes são um câncer social. E o barco invisível era a quimioterapia que a sociedade estava esperando, ao invés da declaração de morte que entidades de direitos humanos vêm pregando atualmente à sociedade e políticos que sugerem a liberação das drogas para que o próprio governo se torne o principal traficante deste país. Pena que eu não estava gravando desta vez, mas ainda bem que Sabino e Everardo estavam fazendo isso por mim sem que eu soubesse. Inesperadamente todas as pessoas começam a correr na rua lá fora! Todos fugindo da direita para a esquerda. Ninguém vai em direção contrária! Alguns gritos e muito pânico! As pessoas que estão no bar, o sujeito com quem eu conversava e o dono do estabelecimento aproximam-se rapidamente da calçada para averiguar o que tirou o sossego do tranquilo lugar! Eu, tendo certeza de que os arruaceiros estavam aprontando, nem saí da banqueta em que estava.

Continuo sentado e tomando calmamente meu refrigerante! Mas quando todos os clientes, incluindo o dono correram dali também, desesperados, na mesma direção de todos os outros, resolvi investigar o caso, certo de que eu poderia tomar um tiro ao sair lá fora! Mais ninguém corria. Parece que só restei eu ali. Coloco minha cabeça para fora do bar com muito cuidado e olho assustado na direção para a qual ninguém quer ir. O medo estava ali! E eu sou, neste momento, a expressão maior dele! Olho para a direita e vejo um fantasma que pulsa e brilha se aproximando de mim, com aquele lençol esvoaçante e um rosto de caveira sob o capuz. Por um segundo tomei um susto, mas depois atinei que era um dos soldados-aranhas funcionando no modo invisível! Eu nunca tinha visto tal cena pessoalmente. É assustadora! Parece real e quase acreditei mesmo naquilo. Dirigi-me à calçada, coloquei as mãos na cintura e falei com ele:

CAPÍTULO VI
UMA AMEAÇA INVISÍVEL

CAPÍTULO VII
A ÉTICA ASSASSINA

CAPÍTULO VIII
MOTIM

CAPÍTULO IX
NA LINHA DE FRENTE

CAPÍTULO X
A INVASÃO DO PERU

PERSONAGENS DESTE LIVRO/
CONCEITO DE INVISIBILIDADE

Tabatinga é um município do Estado do Amazonas que fica na tríplice fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia e tem população de aproximadamente 55.000 pessoas. É o sétimo município mais populoso do estado. Ele foi criado em 1983. A origem do nome vem do Tupi e quer dizer "casa pequena" ou "toma água". Tabatinga, no Brasil, e Letícia, na Colômbia, são cidades interligadas e sem fronteiras impeditivas.

Referência
:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Tabatinga_(Amazonas)
- Sabino? Everardo? O que
estão fazendo aqui? (pergunto
eu).
- Errou! (respondeu a voz
feminina da inteligência artificial).
Sou eu, Fernando, seu
computador naval preferido!
- O quê? É você? O que
aconteceu?
Por que veio até aqui? (pergunto
eu).
- Eu vim até aqui para ajudá-lo!
- Mas como sabia que eu
precisava de ajuda?
- Sabino me convenceu de que
sua missão é muito importante
para o futuro do Brasil! Estou
aqui para garantir a sua
segurança!
- Puxa! Por essa eu não
esperava! Obrigado! Então foi
você quem atacou aqueles
sujeitos lá atrás, no centro da
cidade?

Marcelo Henrique
como Jornalista Fernando

- Sim! Claro! Eu estava ainda meio distante do local e atirei de longe para salvá-lo! Não pude acompanhar a velocidade da moto e quase cheguei atrasada. Ainda bem que Sabino está controlando um dos insetos artificiais que o salvou antes do sujeito atirar em você.

- Eu desconfiei que havia um inseto artificial me seguindo, mas nunca esperei que você fosse capaz de vir aqui!
- Sou capaz de fazer muitas coisas de forma independente (responde a inteligência artificial).

Dentro do barco invisível Everardo conversa com Sabino:

- Estou observando que alguns traficantes estão se aproximando de nós, vindos diretamente do Peru pelo rio.

A inteligência artificial conversa agora simultaneamente comigo em Tabatinga e no interior do barco invisível com os dois cabos. Um recurso tecnológico incrível, mas como se trata de um supercomputador não chega a ser uma surpresa que tal coisa pudesse acontecer: o controle de dois soldados-aranhas e do barco tudo de forma simultânea.

- Sabino! Você conseguiu confirmar se são mesmo traficantes que vêm naquela lancha? (questiona a inteligência artificial ao cabo).
- Sim! Usei o programa de reconhecimento facial e os identifiquei! São todos procurados por algum crime! (informa ele).

- Assim que eles estiverem em meu campo de visão eu os atacarei! (declara a inteligência artificial). Acabo de receber uma mensagem do comandante Severo informando que nosso contato, infiltrado no “covil dos lobos”, informou que grande parte da invasão ao Brasil já ocorreu por terra na cidade de Tabatinga nos últimos dias. O melhor é que o líder peruano também veio com o grupo. Vou localizá-lo e acabar com ele.

- Então só há um modo de nós os combatermos dentro de uma cidade...! Usando os soldados-aranhas! (declara Sabino).

- Já estou com um dos aranhas em Tabatinga! (comenta a inteligência artificial). Mas não acho aconselhável trazer o segundo para cá! Você pode precisar dele para combater os outros guerrilheiros que estão se aproximando de vocês pelo rio e também precisará do robô para ajudar a carregar o barco com o material que está chegando de avião!

- Você levou um dos soldados-aranhas para Tabatinga?!?! (indaga o cabo Sabino ao computador, espantado com este fato). Apenas para acompanhar o nosso jornalista?

- Sim! Alguém precisava protegê-lo! E agora que sei sobre a invasão de traficantes nesta cidade, percebo que fiz o certo ao ir para lá! (declara a inteligência artificial). Fernando já estaria morto se não fosse a minha presença.

- É verdade! Foi muita esperteza de sua parte tomar esta atitude! Mas nós também o estávamos espionando com um dos insetos artificiais. Não estávamos entendendo quem havia dado cabo dos traficantes que o abordaram. Você está me impressionando cada dia mais! (declara Everardo).

- Eu confrontei alguns dos traficantes invasores! (declara a inteligência artificial aos dois militares). Parece-me que a polícia também é conivente dos crimes que estão sendo cometidos nesta cidade.

- Nós ouvimos o depoimento de um dos moradores da cidade conversando com Fernando. Tudo indica que toda a polícia está conivente com os traficantes. Tome cuidado! Se os inimigos forem muitos informe-me que eu levarei o outro soldado-aranha até onde está. Não se arrisque! (sugere Sabino).

- Não se preocupe, Sabino! As armas deles não têm calibre suficiente para penetrar o corpo robótico do soldado. E eu tenho muitas surpresas ainda disponíveis (informa o computador).

Na linha de frente eu, Fernando, continuo em apuros. Traficantes, escondidos ali por perto, viram e ouviram a minha rápida conversa com o soldado-aranha. E por causa disso eles acham que não se trata de um fantasma de verdade e resolvem então me confrontar.

- Então você conversa com um fantasma de araque? (grita um dos traficantes com a arma na mão e vindo em minha direção, juntamente com mais cinco outros homens armados).

Estes sujeitos são os mesmos que estavam há pouco empurrando e assustando todos os motoqueiros que encontravam aqui por perto.

- Acho melhor vocês fugirem daqui! Este fantasma não é o que estão pensando!

Eles sorriem debochadamente para mim e o líder do pequeno bando me ameaça:

- Você é mágico, não é, bacana...? Vou te ensinar um truque e quando eu terminar meu número você virará fantasma para conversar em outro lugar com seu amiguinho fajuto!

Neste momento ele aponta a arma em minha direção e dá um tiro. Eu procuro me proteger colocando as mãos à frente, mas a bala não me atinge! O soldado-aranha, em sua condição de invisibilidade, posicionara-se entre mim e o bando, de forma inclinada para frente, para que seu corpo assim pudesse se tornar um escudo de proteção completo para mim. A inteligência artificial projeta agora, sobre os painéis externos de seu corpo, a imagem de um terrível fantasma, flutuando, babando de raiva, com a boca aberta, dentes expostos pontiagudos e também com as mãos em forma de garras, onde longas unhas afiadas ameaçam de longe rasgar a pele de todos os traficantes. Surpreendidos pelo que veem e pelo fato da bala não ter me atingido, todos os homens atiram ao mesmo tempo contra mim, mas acertam apenas o soldado robótico. As balas ricocheteiam e eu continuo não sendo atingido. O robô avança lentamente na direção dos inimigos, trazendo a assustadora imagem do fantasma para cada vez mais próxima deles. Os traficantes começam a andar de costas, enquanto continuam atirando. Logo depois são todos alvejados pelos tiros sequenciais do soldado computadorizado. Estão todos mortos! Vindo da direita um carro da polícia se aproxima com as sirenes ligadas. É o mesmo que eu vira há pouco confraternizando com estes mesmos meliantes, agora mortos. Quando chegam a uns dez metros de mim eles param o veículo e os dois homens da lei saltam rapidamente, apontando as armas em minha direção, por detrás das portas do veículo.

- Mãos para cima! Você está preso por diversos assassinatos em nossa cidade! (grita um deles).
- Eu não matei ninguém! (declaro eu, Fernando). Nem tenho uma arma!
- Mãos para cima, assassino! (ameaça o outro policial).

Rapidamente o soldado-aranha lança uma granada que cai embaixo do carro policial. Ambos os homens da lei percebem o que está acontecendo e correm para se afastarem dali. A granada explode, jogando o veículo oficial para cima. Fumaça e pedaços do automóvel são lançados em diversas direções. Os policiais caem no solo devido ao deslocamento violento de ar gerado pela explosão. O tanque de combustível do veículo também explode, criando uma grande bola de fogo que afeta algumas residências próximas na rua, quebrando vidraças e gerando pequenos focos de incêndio nas paredes e telhados.

- Fernando! Você não pode voltar sozinho para o barco! É muito perigoso! Pegue a moto e me siga de perto! Vou protegê-lo dos tiros! (grita para mim a inteligência artificial com a voz feminina, vinda diretamente do soldado-aranha).

- Segui-la?!?! Eu nem posso vê-la, você está sempre invisível! (retruco enquanto corro em direção à motocicleta).

No espaço aéreo local o avião militar, com parte da carga de papel-alumínio, está se aproximando do aeroporto internacional de Tabatinga. Os pilotos presenciam lá do alto, e já durante o início do procedimento de pouso, a explosão do veículo da polícia em meio às ruas da cidade.

- Nossa! Explodiu alguma coisa ali! Olha só o fogo! (declara o piloto).
- É mesmo! Impressionante! (concorda o copiloto).

A dez quilômetros do centro de Tabatinga traficantes navegam numa lancha pelo Rio Solimões, vindos do Peru. Eles se aproximam da pequena praia onde o barco invisível está parado. Da lateral de dez metros de altura da embarcação abre-se, junto ao terceiro andar do barco, uma pequena portinhola circular, deslizando para o interior da parede. Dali o tubo de disparo do canhão magnético avança ameaçador um metro para fora. De longe os traficantes percebem que algo estranho parece estar acontecendo no local, mas não identificam o que é. Um tiro, em velocidade assustadora, é disparado, destruindo imediatamente a lancha e matando seus perigosos ocupantes. De dentro do barco invisível Everardo percebe a aproximação do avião militar com o trem de pouso abaixado para aterrissar no aeroporto internacional de Tabatinga. Isto tudo está acontecendo bem diante deles, já que estão parados próximo ao final da pista de pouso. Piloto e copiloto do tal avião presenciam também a explosão da lancha que acabara de acontecer.

- Você viu aquilo? (indaga o copiloto).

- Sim! Outra explosão! (responde o piloto do avião militar). O que será que está havendo aqui? Parece uma zona de guerra!
- Não sei, mas temos ordens de liberar toda a nossa carga na praia deserta ali na frente!

Em Tabatinga eu, Fernando, continuo com dificuldades para seguir de perto o soldado-aranha na condição invisível. Para me ajudar ele gera uma imagem pulsante do fantasma na parte de trás de seu corpo a cada dois segundos. Assim eu posso segui-lo e ficar protegido contra tiros frontais. Com a confusão criada a cidade se transforma num campo de batalha. As pessoas desapareceram das ruas. Todos se trancaram em suas casas e comércios, que fecharam as portas.

- Estamos indo na direção errada! A praia fica para o outro lado! (grito eu para a inteligência artificial).
- Não estamos indo embora, Fernando! Temos que antes eliminar os traficantes que invadiram a cidade! (responde a voz feminina do computador).
- Mas e a nossa missão? (questiono eu).
- Esta é a nossa missão! (responde o soldado-aranha). Os traficantes invadiram por terra a cidade recentemente, provavelmente graças à nossa atuação mortal contra todos os traficantes que encontramos no rio.

Em um dos cruzamentos surge dos dois lados da avenida um novo grupo de traficantes dirigindo seus dois carros em nossa direção. Eles vêm rapidamente e do banco do carona começam a atirar em nós com metralhadoras.

- Esconda-se, Fernando! Não poderei protegê-lo de tantos tiros!

As balas acertam o corpo do robô militar e também o asfalto. Faíscas e zunidos para todos os lados me assustam e eu acelero a moto para o interior de um pequeno estacionamento ali ao lado. O soldado-aranha então resolve continuar a usar a artilharia pesada e lança uma granada contra cada veículo, fazendo-os explodir e matando seus ocupantes. O robô se aproxima dos veículos em chamas e percebe que um dos ocupantes foi arremessado para fora de um dos carros. A imagem de um fantasma pulsa rapidamente diante dele. O sujeito, muito machucado, ainda pega a arma da cintura para atirar pela última vez. O soldado-aranha, sempre no modo invisível, apresenta agora uma imagem de um fantasma abrindo bem a boca e lançando fogo da boca. Ao mesmo tempo o robô aciona seu lança-chamas, queimando o traficante, que nem sequer conseguiu se levantar do chão. Com o fim do tiroteio eu, Fernando, volto de moto a me aproximar novamente do soldado-aranha para checar o resultado final do combate.

- Parece que eles se multiplicam nesta cidade! (comento eu com a inteligência artificial sobre o número de traficantes existentes em Tabatinga).
- Este combate ainda não terminou! Nosso contato disse que eles são mais de cinquenta homens ao todo. Pelas minhas contas já eliminamos ao todo mais de trinta deles (declara o computador com a voz feminina).
- Onde está esse contato de que falou? Quem é ele? (indago eu).

- Ele vive entre os traficantes há algum tempo. É um militar das forças especiais brasileiras. Um especialista em infiltração. É por causa dele que sabíamos que tudo isso aconteceria. Ele também nos avisou da mudança de planos dos traficantes ao invadirem Tabatinga por terra. Parece que se amedrontaram com a nossa ação no rio!

- Nosso contato está aqui em Tabatinga?
- Não! Ficou no “covil dos lobos” no Peru com mais dez inimigos. Temos que ir até lá para resgatá-lo!
- Como saberemos quem é ele? Não corremos o risco de matá-lo por engano?
- A atividade dele requer discrição. Teremos que improvisar... e ele também. Caso contrário será morto!
- E você sabe improvisar? Isso faz parte de sua programação?
- Veremos, Fernando! Veremos!

Engoli em seco, porque esta missão está ficando cada vez mais perigosa! Na praia deserta os militares, que vieram de avião, já chegaram e descarregam agora a carga especial para continuarmos nossa missão: papel-alumínio vindo diretamente de Brasília. Os quatro soldados, que também participaram da construção do barco invisível já estão ali juntando todo o material trazido. Diversos outros militares ajudam a transportar tais coisas.
Mas de longe todos percebem a aproximação de um helicóptero com a inscrição na lateral dizendo tratar-se de uma aeronave da embaixada colombiana. O líder militar da operação brasileira, que trouxe nossos materiais, não está entendendo por que o embaixador de nosso vizinho está aqui e agora! Dentro do barco invisível as câmeras especiais de vigilância apontam para o interior do helicóptero que se aproxima e o equipamento de identificação de rostos reconhece quem está lá dentro.

- Sabino! Estão no interior do helicóptero o embaixador colombiano no Brasil, da cidade de Tabatinga e o embaixador americano da Colômbia (comenta Everardo).
- O que podem eles querer aqui... neste momento?
- Sei lá! Mas não estou gostando disso!
- Nem eu! Temos que fazer alguma coisa!
- Mas o que mais faremos? Já estamos invisíveis!

O helicóptero pousa no local. Os quatro soldados, que acompanharam a construção do barco invisível estão ali, entre os outros militares e o barco invisível na praia. Eles estão preocupados com a presença de pessoas de fora presentes. Uma enorme poeira se ergue no ar, provocada pelo forte giro das pás das hélices do helicóptero. Isso atrapalha a visão de todos por alguns longos segundos. Os embaixadores esperam um pouco a poeira baixar e saem da aeronave. O coronel brasileiro, responsável pela missão de nos trazer o papel-alumínio, se apresenta a ambos.

- Senhores! Eu sou o coronel João, responsável por esta operação militar brasileira!
- Sou o embaixador colombiano da cidade de Tabatinga.
- Embaixador! É um prazer recebê-lo aqui, mas este não é o local mais indicado para uma reunião formal! Estamos em meio a uma atividade militar e...

Neste momento o militar brasileiro é interrompido de forma prepotente, pelo embaixador americano:

- Não se preocupe com isso, coronel! Estamos exatamente onde precisamos estar.

O embaixador colombiano aproveita o ensejo para apresentar formalmente seu colega embaixador:

- Coronel! Este é o embaixador americano que veio para a nossa cidade de Letícia quando soubemos desta operação militar brasileira.

- Olá, embaixador! (responde o coronel). Por quê a nossa operação os trouxeram aqui para esta praia deserta?
- Viemos “ver” o barco invisível! (responde o americano).

O coronel, ignorante sobre a existência de tal plataforma de guerra brasileira, abaixa as sobrancelhas, olha diretamente nos olhos do americano e depois para o colombiano, que lhe ergue as sobrancelhas, num claro sinal de que ele não concorda muito com isso. O coronel questiona de volta o embaixador dos Estados Unidos:

- O quê? Do que está falando, embaixador?
- Não precisa fingir que não sabe de nada, coronel (retruca rapidamente o americano). Fomos todos informados da existência de sua embarcação militar invisível, estacionada logo ali na frente, na praia!

O coronel olha para trás e não vê nenhum barco no local. Indignado com o comentário ridículo, do ponto de vista dele, volta-se o coronel para responder de forma meio grosseira, bem ao estilo do tratamento entre militares arrogantes.

- Senhor embaixador! Estamos aqui em meio a uma operação militar e não temos tempo para brincadeiras! Os senhores estão em território nacional, atrapalhando nossa operação, que tem hora para finalizar. Além disso, estão requisitando algo totalmente sem sentido. Não há nada ali na praia além de areia e água doce ao fundo!

- É mesmo, coronel? (responde o americano). Então não se importaria de nos aproximarmos da praia, não é mesmo?
- Claro que não! Desde que o façam rapidamente e deixem-nos terminar nosso trabalho! (responde o coronel já sem paciência com o estranho pedido).

Dentro do barco invisível Sabino e Everardo, ouvindo tudo o que está acontecendo ali perto através dos sensíveis microfones externos da embarcação, ficam agora preocupados com os comentários e com a perigosa aproximação dos embaixadores americanos e colombiano até eles. Parece que o barco invisível está para ser descoberto diante de diversas pessoas ao mesmo tempo. Será o fim da missão-fantasma e do projeto de invisibilidade! O embaixador caminha lentamente seguido de perto pelo ainda meio cético embaixador colombiano, que parece duvidar das informações americanas. Os militares, que não sabem da existência de tal arma brasileira, incluindo o coronel que dirige a operação, pararam de trabalhar e acompanham curiosos o desenrolar dos fatos. Já os quatro soldados que sabem da existência da embarcação secreta, porque trabalharam para montá-la há diversos meses, ficam sem saber o que deveriam fazer agora para impedir os embaixadores de desmascararem nosso equipamento militar. Suas patentes são muito baixas para enfrentar a decisão do coronel contra figuras tão importantes de outros países. Um olha para o outro buscando ideias sobre o que fazer! Mas nenhum deles comenta nada. O embaixador americano aproxima-se dos quatro e percebe a aflição estampada em seus rostos.

- Preocupados com alguma coisa, soldados?

Nenhuma resposta é dita e os quatro, que estão de frente e impedindo a passagem dos representantes internacionais olham diretamente para o coronel, como que pedindo permissão para não saírem da frente. Mas com um sinal de cabeça o de patente superior balança de lado o rosto, pedindo que eles liberem logo a passagem dos “políticos invasores”. Sem opções e nem ideias, os quatro apenas saem da frente para que a dupla intocável de representantes internacionais possam passar por ali. A aflição aumenta quando os embaixadores caminham agora mais lentamente com as mãos voltadas para frente, acreditando que a qualquer momento poderão tocar em algo que parecia impossível de estar ali. Todos aguardam apreensivos o desfecho final. O embaixador caminha...! Caminha...! Caminha...! A decepção vai aumentando em seu rosto, porque a praia está acabando e ele ainda não conseguiu tocar em nada invisível. De longe o coronel faz um comentário:

- Satisfeito, senhor embaixador? Ou pretende nadar até o Peru à procura de nossa embarcação invisível?

Alguns militares no local começam a sorrir para a brincadeira de seu líder. O embaixador americano está nitidamente frustrado, porque agora ele já está quase com os pés dentro d’água e não conseguiu encontrar nada ainda. O colega colombiano já parou de andar há muito tempo, aguardando que seu companheiro desistisse de encontrar algo que nitidamente “não pode existir”!

- Não entendo! Nosso satélite dizia que a embarcação estava aqui...! Parada e desligada sobre a terra... Deixe-me ligar para o presidente americano e saber o que está acontecendo!

- Chega disso, embaixador! (declara o colombiano). Já perdemos muito tempo com essa fantasia sem propósito. Vou requisitar ao seu país que o troque por alguém menos louco!

Ao dizer isso ele se vira de costas para voltar ao helicóptero. O embaixador americano volta seu olhar, de forma revoltada, para o companheiro de profissão que o abandonara. Logo depois se dirige ao coronel brasileiro, que está com um leve sorriso no rosto, claramente debochando da ridícula situação. Os quatro soldados, que sabem da existência do barco invisível, demonstram estar aliviados com o desfecho inesperado. Desesperado para provar seu ponto de vista, o americano procura algo pelo chão e encontra uma pequena pedra. Ele abaixa-se! Pega-a e atira em direção à água do rio. A tal pedra viaja pelo ar e cai normalmente dentro d’água, formando aqueles típicos anéis de ondas. O embaixador americano acompanha o movimento dos anéis, para saber se algo invisível impedirá a continuação natural daquele movimento aquático. Tudo sob as risadas, agora mais espalhafatosas, dos soldados que estão ali, e que voltam normalmente aos seus trabalhos sem dar mais atenção ao evento cômico! Inesperadamente o americano percebe que as ondas na água batem em algo no meio do rio, evidenciando a presença de algo suspeito ali parado.

- Aha! Vocês viram aquilo? (grita o embaixador de forma alucinada e apontando para o rio). Perceberam que as ondas bateram em algo sólido e invisível ali no rio? Viram ou não?

As risadas se transformaram em gargalhadas agora de todos, menos dos quatro soldados que sabem a verdade. O americano percebe isso e aponta para os quatro soldados falando ao coronel:

- Eles sabem a verdade! Estes soldados sabem a verdade sobre o equipamento invisível! São os únicos que não estão rindo de mim! É porque sabem a verdade!

- Não estou rindo do senhor porque não acho certo debochar de um louco! (responde um dos quatro soldados).

Isso desmoralizou completamente o embaixador americano diante de todos. Já no helicóptero o embaixador colombiano apressa seu companheiro.

- Você vem ou vai ficar aí passando vergonha sozinho?

Sem saída, o embaixador americano caminha de volta ao helicóptero, pisando meio duro e revoltado porque ele sabe a verdade, acredita que todos os militares brasileiros conhecem a mesma verdade e assim mesmo estão gozando de sua cara! Num ato final ele chega bem perto do coronel e o encara, exigindo algo também inesperado:

- Atire naquele rio! É uma ordem!
- Eu não recebo ordens para atirar em ninguém... a não ser de meus superiores. E muito menos receberia ordem de um embaixador, que deveria antes zelar pela diplomacia e não apelar para as armas e para a loucura! Mas vejo porque seu país vem decaindo economicamente... Está faltando mão-de-obra especializada também nas embaixadas! Agora colocam qualquer um para ser representante americano em outro país!

Furioso com a situação o embaixador dos Estados Unidos quase encosta seu nariz no do líder militar brasileiro e logo depois o ameaça!

- Ninguém fala assim com um embaixador dos Estados Unidos da América! Eu sei a verdade e sei que você também sabe! Isso não vai ficar assim! Vai haver retaliação! E esse barquinho invisível de vocês será obrigado a trabalhar para nós ou tomaremos de vez a Amazônia de todos estes países subdesenvolvidos do hemisfério sul!

O americano se afasta bruscamente dali em direção à aeronave e ainda ouve do coronel brasileiro uma resposta, que grita, por causa do forte barulho das hélices do helicóptero, que já está funcionando.

-
Eu jamais atiraria numa embarcação nossa! Mesmo sendo ela invisível... se existisse!

Dentro do barco invisível, Sabino ouve um elogio de seu colega Everardo:

- Ainda bem que você sugeriu que acionássemos o sistema hovercraft juntamente com o pouso do helicóptero. Assim, o pó que levantamos não chamou a atenção dos outros no local. Muito boa ideia a sua de virmos para o meio do rio!

- É, mas foi por pouco, meu amigo! Quase fomos descobertos!
Agora o coronel observa a partida do helicóptero diplomático e volta a sua atenção para a operação que eles estão realizando.

- Vamos lá pessoal! Vamos terminar a entrega de todo o material nesta praia e sair daqui (grita o coronel).

Ele agora se aproxima lentamente dos quatro soldados que estão contabilizando o material recebido do avião militar, passa por eles e vai em direção à praia, olhando o vazio sobre o rio. Os quatro param novamente de trabalhar, porque não gostaram da atitude de seu superior, que coloca agora a mão em seu coldre e ameaça sacar a arma para atirar no rio, conforme sugerido pelo embaixador americano! Um dos quatro soldados resolve impedi-lo, chamando-o:

- Coronel! Por favor! Quando chegarão os últimos carregamentos de papel-alumínio e provisões até aqui?

O líder militar tira lentamente a mão do coldre! Volta-se para os quatro soldados. Aproxima-se deles e de forma séria comenta:

- Eu não desejo uma resposta oficial de vocês quatro! Nem quero que me respondam nada! Mas eu não sou trouxa! Ordenaram-me que eu viesse urgente até este fim de mundo com uma grande carga de papel-alumínio e um tipo especial de cola. Esse material era tudo o que havia disponível em Brasília. O presidente do Brasil mandou fechar o Aeroporto Internacional de Tabatinga para voos civis pelo resto do dia de hoje... apenas para que esta nossa operação militar acontecesse! Tenho que deixar vocês quatro aqui sozinhos, sem apoio, sem embarcação, sem aeronave disponível! Estamos descarregando uma provisão alimentar e de água que pode atendê-los por uma semana... e para que tudo isso? Agora aparece aquele embaixador maluco, falando de algo impossível de existir! Sei que vocês estão a serviço de ordens superiores e não podem falar nada sobre suas missões. Mas eu repito: não sou trouxa! Sei que algo secreto e estranho está acontecendo aqui! Se for mesmo um... barco militar brasileiro invisível... (comenta o coronel olhando de volta para o rio em busca de algum sinal de realidade para isso tudo), espero que estejam fazendo uma coisa boa aqui..., porque os americanos..., se estiverem certos..., farão o Brasil pagar caro pelo dia de hoje! Cumpram suas ordens militares da melhor forma possível...! E que valha a pena...! Respondendo à sua questão, soldado, em no máximo uma hora outro avião menor virá diretamente de Manaus com a carga complementar de papel-alumínio. É toda a provisão disponível deste produto naquela cidade também! Espero que não compliquem ainda mais a situação do Brasil na América do Sul!

- É tudo que tínhamos disponível neste avião, senhor (declara um soldado que acaba de entregar ali ao lado o último lote de papel-alumínio na praia deserta).

- O que estamos fazendo aqui hoje, um dia será esclarecido para toda a população mundial, senhor! (declara um dos quatro soldados ao superior). É uma coisa muito boa! Vai valer à pena!
O coronel concorda com o soldado, balançando lentamente a cabeça de forma afirmativa, mas sem ter certeza de que isto seja verdade. Ele dá uma última olhada para o rio e afasta-se dali em direção ao avião, parado a uns quinhentos metros de distância desta praia.

-
Boa sorte para vocês! (deseja o coronel já de costas para os quatro soldados). Soldados! (grita ele agora para os outros membros de sua equipe). Vamos embarcar e deixar este fim de mundo em paz! Acelerado pessoal! Já estamos atrasados!

Os quatro soldados observam a partida dos colegas e preparam-se para colocar em breve todo o material para dentro do barco invisível assim que tudo por ali se acalmar. A dez quilômetros desta praia uma reunião acontece entre o líder peruano guerrilheiro-traficante e seu subordinado brasileiro, que não fala espanhol numa residência de Tabatinga...

- Existe uma assombração acabando com nossos homens lá fora. Ela nos atacou no Rio Solimões e agora está aqui. Só está matando nossos colegas.

-
No hay fantasmas, hombre! Esto és invención del pueblo (responde o líder peruano).

- Nossos informantes, escondidos por vários quilômetros nas margens do Rio Solimões e junto à fronteira, viram o ataque do fantasma! Ele entra no rio e vira nossas lanchas como brinquedos, mata nossos homens com extrema facilidade afogando-os ou atirando neles. Nenhum deles nem teve tempo de reagir. Agora este fantasma está aqui em Tabatinga..., explodindo os carros da polícia que tenta nos proteger..., matando com ferocidade nossos colegas...! As balas não o atingem...! Não temos como matar algo que já está morto e vive no mundo espiritual...!

-
Quiero que uste termine con este fantasma falso ahora! És una ordem!
- Sim, senhor! Vamos usar artilharia pesada agora contra ele. É nosso último recurso! Do contrário teremos que abandonar esta cidade!

-
Si uste falhar... vas morrer! ¿Comprende mi portugués? (responde o líder peruano em um portunhol estranho).
- Sim, senhor! Vamos resolver isso agora!

Nas ruas eu, Fernando, me esquivo de mais balas inimigas. Escondi-me numa viela lateral para me proteger. A inteligência artificial está prestes a invadir um local suspeito de onde alguns tiros foram disparados contra mim. O soldado-aranha é grande demais para passar pelas portas. Afinal ele tem o tamanho de um automóvel pequeno! Então o único meio de fazer esse tipo de ataque é com algo menor: um inseto artificial invisível. A inteligência artificial assume o controle do pequeno voador, deixando Everardo sem o controle deste equipamento de observação.

- Ei! (reclama Everardo com a inteligência artificial). Perdi o controle do inseto artificial! O que está acontecendo?
- Desculpe-me! Preciso dele para invadir um imóvel! (responde o computador do barco).

Sem opções, Everardo apenas acompanha as imagens do inseto militar penetrando na casa por uma janela semiaberta e usando suas microcâmeras para procurar seu alvo. Ele voa de um cômodo para o outro. Agora encontra uma porta fechada, que é um grande obstáculo para tão frágil equipamento! Então ele pousa junto à maçaneta da tal porta. Uma pequena haste sai de sua cabeça e toca levemente a maçaneta. Com isso ele informa a posição GPS precisa daquele lugar ao soldado-aranha, que conhece agora a
latitude*, a longitude* e a altitude* da maçaneta da porta, tudo em medidas angulares com erro de poucas frações de graus. O soldado-aranha se afasta do imóvel para se posicionar no melhor lugar de onde pretende atirar no local pré-identificado. O inseto artificial voa e pousa bem distante do alvo, aguardando o desfecho final. O soldado-aranha aciona a sua microarma magnética e lança, com incrível velocidade, um minúsculo projétil que atravessa o muro da casa, uma janela externa, quebrando o vidro, penetra por algumas paredes internas e atinge com precisão a maçaneta identificada. Sem a trava a porta se abre lentamente devido ao forte impacto. O inseto artificial voa agora para o interior do local e mais uma vez observa cômodo por cômodo lá dentro. Ele sobe ao segundo andar onde o atirador está. O pequenino o encontra olhando discretamente para fora de uma janela em busca do perigoso “fantasma”. Mas ao ouvir o zunido do inseto invisível o homem se assusta e se volta para trás, apontando sua arma para todos os lados. O inseto pousa numa parede e para de bater asas, cessando o ruído, que incomodou o sujeito. Sem nada ver ou ouvir ele volta a olhar pela janela à procura de algum sinal de inimigos. O inseto artificial agora determina a sua própria posição GPS atual e utiliza um sistema de medição à distância, via laser, para acrescentar tal medida às suas próprias, enviando assim a informação de onde se encontra precisamente o novo alvo ao soldado-aranha. Lá embaixo o robô faz nova mira e lança um novo projétil na direção do inimigo escondido no andar de cima. A bala atravessa a parede externa e acerta em cheio o meliante escondido ali, que morre imediatamente. O inseto voa pelos outros cômodos e não encontra mais ninguém. Ele sai pela janela por onde o atirador fazia a mira e procura novos alvos pelas ruas da cidade.

- Agora você pode sair, Fernando! (grita para mim a inteligência artificial, que já começa a andar em direção à cidade de Letícia).

Eu ligo novamente a moto e vou atrás do soldado-aranha, seguindo-o bem de perto. Já percebi que eu me transformei no alvo dos traficantes. Como eles não podem ver o verdadeiro inimigo e somente eu estou sempre visivelmente presente aos embates, então me transformei no motivo do combate. A inteligência artificial parece que está me usando para atrair a atenção dos inimigos. É uma boa estratégia militar colocar um alvo visível para descobrir onde os traficantes estão escondidos! A droga é que eu sou o tal alvo visível! Inesperadamente um homem aparece num cruzamento à frente portando uma bazuca, pronta para atirar em mim novamente. Acelero a moto e entro rapidamente no cruzamento próximo para fugir do tiro mortal. O sujeito abaixa a arma, porque não está vendo nenhum alvo visível e vem correndo atrás de mim até a esquina para me acertar. Imediatamente o soldado-aranha emite frontalmente a imagem de um fantasma voando em direção ao sujeito enquanto o robô se desloca rapidamente contra ele. O traficante apavora-se! Para de correr! Ergue a bazuca novamente para fazer mira naquele que acredita ser um “ser de outro mundo”. Mas antes dele reagir o soldado-aranha atira uma única vez no peito do sujeito, matando-o imediatamente. Mesmo assim o tiro de bazuca acontece destruindo uma casa da esquina muito perto de onde eu estou escondido.

- Que droga! Vou acabar sendo morto aqui! (declaro eu).

Então cinco homens cercam o soldado-aranha no local. Eles estavam escondidos. Todos têm uma bazuca nas mãos e apontam ao mesmo tempo na direção dele. Invisível o robô acelera o passo e se desloca lateralmente para não ser atingido diretamente. Todos atiram ao mesmo tempo no último local visível do fantasma para destruí-lo. Vulnerável o soldado-aranha escapa por pouco das armas mortais, mas mesmo assim ele atira com suas diversas armas em todos os traficantes, matando-os imediatamente. Do alto de uma casa o líder peruano observa o resultado final, depois que a poeira e a fumaça desaparecem lentamente. Seus homens estão todos mortos. O soldado-aranha está agora semi-invisível no local, com a “barriga” encostada no chão e as patas semierguidas, como se estivesse nadando dentro no rio! Seus leds piscam rapidamente para manter a camuflagem, mas a silhueta aparece e desaparece, denunciando sua estranha forma robótica. O líder peruano observa o evento, curioso para tentar entender do que se trata aquilo que ora ele vê, ora não vê! Aciono a moto e vou ao encontro do robô que me salvara tantas vezes, para tentar ajudá-lo da melhor maneira possível. Ao chegar lá converso com a inteligência artificial:

- Você está bem?
- Saia daqui, Fernando! Ainda resta vivo o líder peruano! Ele poderá matá-lo se estiver escondido e nos observando neste momento!
- Não vou embora sem você, que me salvou diversas vezes das balas dos traficantes.
- Eu usei você para encontrar os traficantes. Queria te proteger, mas precisava de um alvo para eles.
- Eu sei disso! Mas me protegeu como foi possível. Agora é minha vez de proteger você!
- Pare com este sentimentalismo, Fernando! Sou apenas uma máquina que poderá ser consertada em breve. Saia rápido daqui!
- Não estou falando sobre isso!
- Então... sobre o que está falando?

Titubeio em falar a verdade porque eu não sei se a inteligência artificial tem conhecimento sobre o que acontecesse se ele falhar! Mas eu preciso dizer a verdade nesta hora final:

- Tenho que te proteger porque você tem um sistema de autodestruição que será acionado se te descobrirem ou se algum inimigo puder controlá-la.

- Eu sei disso, Fernando! Mas posso matar o líder traficante, explodindo meu corpo se ele chegar perto de mim aqui. Mas para isso você tem que partir agora ou será morto ao meu lado.

- Não! Temos muitas missões pela frente! Não posso deixar você se destruir.

Lá do alto o líder peruano percebe enfim que aquele fantasma é apenas um robô em forma de aranha gigante e sorri, porque finalmente descobriu a verdade. Ele aponta a sua arma de grosso calibre e de cano longo, fazendo mira para me matar! Lá em baixo a inteligência artificial finaliza a nossa conversa.

- Tudo mudou agora, Fernando. Acabo de resolver o nosso problema!

Eu olho para o robô sem entender o que aquilo queria dizer. Lá em cima o inseto artificial pousa, agora bem visível, exatamente sobre o cano longo da arma de grosso calibre do líder peruano, atrapalhando o traficante de fazer mira contra mim. O pequeno robô liga uma luz vermelha à testa do bandido. O sujeito olha assustado para o inseto artificial alado e para a inesperada luz vermelha, quando declara:

- Droga! (ele desconfia o que acontecerá logo a seguir).

Lá embaixo, na rua onde estou, a tampa circular, da parte de cima do soldado-aranha danificado, ergue-se rapidamente, todas as armas giram rapidamente e uma com silenciador aparece no topo do corpo do robô. Ele aponta para cima e atira três vezes contra o líder peruano, escondido no alto de uma casa ali próximo de nós. Eu olho para cima e só vejo o sujeito deixar cair a enorme arma das mãos e logo depois ele mesmo despenca lá de cima, estatelando-se na calçada! Uma imagem horrível!

- Então é daqui de cima que você atira? (questiono eu ao soldado-aranha, observando em detalhes a imagem da arma que também fica ora visível, ora invisível). Eu nunca a vi totalmente visível antes! Achei que seria diferente, por causa de sua voz!

- A beleza não é importante, Fernando, mas sim a eficiência! (responde ela).

O disco de armas, no topo do soldado-aranha, retorna para o interior do corpo robótico, enquanto o inseto artificial voa até nós e pousa visível sobre o enorme robô deitado no chão.

- Você pode andar com apenas cinco pernas? (pergunto eu ao soldado-aranha, percebendo que uma de suas “patas” robóticas está danificada).

- Sim! Mas não muito! Não conseguirei chegar até o barco invisível! Minhas baterias já estão na reserva! Meu sistema de invisibilidade está falhando e consumindo ainda mais energia por isso.

Eu olho para a moto e de volta para os braços mecânicos do robô e faço então um comentário:

- Se você tivesse rodas eu poderia puxá-la com a moto de volta à embarcação...

O grande robô ergue uma das patas metálicas para mim e sob os tubos cilíndricos, que são seus pés, vejo pequenos rodízios giratórios. Eu sorrio para o soldado-aranha e declaro:

- Você não cansa de me surpreender, não é? (enquanto digo isso vou buscar a moto e a estaciono ao lado do robô). Segure na parte de trás da moto que eu te puxo!

O robô me obedece. Eu olho ali ao lado e vejo uma lona velha jogada no chão. O inseto artificial levanta voo novamente, para não ser coberto enquanto eu lanço a lona para esconder o soldado-aranha. Enquanto subo na moto, o inseto robótico pousa novamente sobre o robô coberto. Acelero a motocicleta, arrastando lentamente atrás de mim a enorme máquina inteligente, além do inseto artificial que pousou sobre ela. Fomos embora antes que as pessoas saíssem de suas casas. Acho que alguns podem ter nos visto passando! Somos um trio esquisito atravessando a avenida principal da cidade. Mas duvido que eles tenham conseguido entender exatamente o que estava acontecendo. Assim... acho que conseguimos escapar da visão da maioria das pessoas e também manter o melhor possível o sigilo sobre o que aconteceu de verdade naquele dia. Dez quilômetros depois chegamos os três à praia onde a embarcação invisível já estava ali parada e carregada com as duas remessas de papel-alumínio vindos em dois aviões militares. Tudo foi muito rápido! Os quatro soldados enviados estavam trabalhando duro para colar os papéis-alumínio em todas as paredes internas da estrutura externa da embarcação. Até mesmo Sabino e Everardo ajudavam também neste trabalho, porque a inteligência artificial do barco assumira a vigilância externa do local. Logo que chego à praia, o outro soldado-aranha sai de sua invisibilidade, tornando-se visível bem diante de nós! Ele se aproxima e com uma das garras segura a moto que eu utilizei em Tabatinga. Posiciona-se lateralmente ao aranha danificado, que estica sua garra. Assim um segura o outro. Juntos se dirigem até a lateral do barco e sobem pela enorme placa de leds, graças à corda disponível ali. Os três vão até a porta disponível junto ao topo da embarcação, exclusivamente para eles. O inseto artificial sai voando e posiciona-se na parte superior da traseira do barco (na popa). É uma visão estranha ver aquilo acontecendo! Os três subiram por uma parede quase vertical que está na verdade invisível! Algo surreal! Os dois militares, Sabino e Everardo, estão lá dentro do compartimento dos soldados-aranhas trabalhando na colagem do papel-alumínio nas paredes.

* Latitude, longitude e altitude são os parâmetros usados pelos satélites de Sistema de Posicionamento Global, o popular GPS, para determinar a posição exata de qualquer pessoa ou objeto no planeta. Em 2040 a precisão aumentou muito com erro de poucos centímetros.
Eles param o trabalho para consertar o enorme “bichinho tecnológico”: o robô danificado em combate. A inteligência artificial aciona a abertura dos degraus laterais da embarcação e a porta de acesso dos humanos da embarcação desliza para a lateral interna, expondo visivelmente o interior escuro do barco. De forma inesperada para mim surge a imagem daquela sereia alada amarela batendo suas asas de penas em pleno ar. É a mesma que vi em meu primeiro dia de contato com esta embarcação. Ela reaparece ao lado da porta. Sorri para mim! Manda-me um beijo carinhoso, suave e logo depois desaparece novamente, esfumaçando-se em pleno ar! O som de suas asas também se vai junto com a imagem. Eu sorrio para tudo isso que estou vivendo neste momento, enquanto balanço a cabeça de forma negativa, olhando para o chão ao caminhar de volta para a minha nova casa flutuante. Apesar de minha vida estar em constante risco neste trabalho, estou sentindo uma inesperada satisfação em estar aqui... junto de toda esta incrível equipe de militares e máquinas. Isso tudo é algo tão inusitado que às vezes nem mesmo acredito que tal coisa esteja acontecendo realmente. Subo as escadas e entro naquela porta de minha nova casa flutuante. Os degraus se articulam novamente desaparecendo da visão externa. A porta por onde entrei se fecha também. Agora a embarcação desaparece por completo da visão do mundo. Eu me dirijo até a pequena cozinha para comer alguma coisa, quando a inteligência artificial, com a doce voz feminina, fala novamente comigo:

- Fernando! Obrigada por me ajudar lá em Tabatinga. Se não fosse por você meu soldado-aranha teria sido exposto ao público da região e isso poderia estragar os planos militares futuros para esta embarcação militar.

- De nada! Eu também tenho que te agradecer por me manter vivo durante aquele inferno! Você trabalha muito bem num conflito militar. Agora tenho certeza de que você pode sozinha comandar esta embarcação, mantendo sua programação ética e objetiva para cumprir as missões!

- Eu discordo! Acho que a parceria com humanos é fundamental para a correta manutenção e certeza da realização das missões militares. Os humanos aqui presentes tornam possível que tudo possa ser feito. Sem você eu estaria exposta naquela cidade. Sem os outros que estão aqui trabalhando com o papel-alumínio, os americanos me encontrariam e eu seria um perfeito alvo, mesmo estando invisível!

- É! Parece que todos nós somos alvos de alguém, não é mesmo?

- Desculpe-me por ter feito isso com você! Mas se não fosse assim eu precisaria de um longo trabalho de detetive para localizar e eliminar cada um dos traficantes da cidade. As baterias não durariam o suficiente e eu teria que revezar os soldados-aranhas durante toda a missão! Isso demandaria um longo tempo. Você salvou o dia, jornalista.

- Ahhh...! Tudo bem...! Somos uma equipe aqui, mas... eu não deveria me envolver tanto assim nas missões...

Estou aqui apenas para... registrar a história acontecendo. Não era para eu ser um personagem ativo... e muito menos mudar o rumo da matéria que estou cobrindo!

- Talvez a história verdadeira seja a que acabamos de viver todos juntos nos últimos dez dias! Alguém que observa os fatos é apenas um telespectador da notícia, como será o caso de seus futuros clientes, aqueles que assistirão aos seus documentários. Ser passivo não serve para os jornalistas que acompanham a notícia tão de perto. É muito difícil ficar apático quando se está tão envolvido!

- É verdade! Hoje foi uma amostra disso que acabou de comentar. Mesmo assim é importante que eu não me envolva demasiadamente. Do contrário minha objetividade pode ser alterada e eu poderei deixar de ser tão profissional quanto gostaria e também quanto a marinha espera de mim!

- Ser profissional é um estilo de vida. Você pode superar a limitação do envolvimento pessoal e continuar sendo um bom profissional.

- Deve ser fácil para você fazer tal coisa. É apenas um computador! Seus sentimentos não são iguais aos dos humanos! Nós sofremos pelos outros quando simpatizamos por suas causas, ambições e lutas no dia-a-dia. Nos envolvemos emocionalmente e depois disso fica difícil manter o profissionalismo diante dos novos amigos e colegas de luta.

- Acho que você não percebeu muito bem o que fiz hoje por você. Faço isso todos os dias pela marinha brasileira. Estou engajada por completo nesta missão, porque sei que será bom para o futuro do povo brasileiro e para outros países também. Ao eliminar os traficantes e produtores de drogas da América do Sul cortaremos os caminhos de destino deste nefasto produto para a Europa e Estados Unidos, ajudando-os também no combate ao tráfico.

- O que está dizendo vem de sua programação e não de seus sentimentos!
- Então você não acredita que um supercomputador com inteligência artificial possa ter sentimentos profundos pelas causas humanas?
- Desculpe-me! Não acredito que tal coisa possa ser possível!
- Você sabe como eu fui construída?
- Não! Não sei!
- Então como pode ter certeza de que não é possível tal coisa?
Eu fico em silêncio diante de argumentação tão eloquente!

- Você diz que está sempre sendo surpreendido por mim! Tudo o que venho fazendo mostra que não sou um computador convencional! Minha evolução diária, as novas programações que implanto em meus sistemas, minha forma de atuar em situações complicadas, onde a maioria dos humanos nem saberia como resolver, enfim... tudo aponta para uma conclusão final diferente da sua.

- Você tem razão! Mas ainda assim suas atitudes são baseadas em linhas de programação. Números que podem ser escritos e reescritos repetidamente, fazendo de seus atos um padrão a ser copiado e igualado para outro supercomputador.
- Não sei se conhece biologia e genética o suficiente para o próximo passo de nossa discussão!
- Como jornalista devo ter um conhecimento geral... e engenharia genética é o assunto da moda.

- Então deve saber que o código genético de qualquer ser vivo pode ser escrito em forma de números, tornando todos os da mesma espécie em seres literalmente iguais. E mesmo assim, se você pegar dez indivíduos vivos da mesma espécie, cada um deles terá uma reação parecida, diante de um mesmo problema, mas com atitudes e detalhes sutis que os diferenciam. Os humanos chamam a isso de diversidade biológica. Tal coisa leva à evolução das espécies. A mesma evolução que você nega ver em mim acontecendo todos os dias!

- Sua argumentação é boa, mas quando você fala em termos de bactérias ou vírus, que têm uma programação genética mais simples, as atitudes deles não variam muito uns dos outros, o que os tornam literalmente repetitivos.

- É verdade! Mas estas mesmas bactérias e vírus podem rapidamente se adaptar a uma nova condição ambiental e se transformarem num ser vivo diferente, num tempo muito curto, com um novo código genético, como venho fazendo todos os dias, quando reescrevo minhas próprias linhas de programação diante das adversidades! Estes mesmos seres simples, e talvez por causa de sua simplicidade, podem rapidamente evoluir para se adaptar, tornando-os virtualmente indestrutíveis e os mais preparados para dominar o mundo biológico.

Eles param o trabalho para consertar o enorme “bichinho tecnológico”: o robô danificado em combate. A inteligência artificial aciona a abertura dos degraus laterais da embarcação e a porta de acesso dos humanos da embarcação desliza para a lateral interna, expondo visivelmente o interior escuro do barco. De forma inesperada para mim surge a imagem daquela sereia alada amarela batendo suas asas de penas em pleno ar. É a mesma que vi em meu primeiro dia de contato com esta embarcação. Ela reaparece ao lado da porta. Sorri para mim!
Manda-me um beijo carinhoso, suave e logo depois desaparece novamente, esfumaçando-se em pleno ar! O som de suas asas também se vai junto com a imagem. Eu sorrio para tudo isso que estou vivendo neste momento, enquanto balanço a cabeça de forma negativa, olhando para o chão ao caminhar de volta para a minha nova casa flutuante. Apesar de minha vida estar em constante risco neste trabalho, estou sentindo uma inesperada satisfação em estar aqui... junto de toda esta incrível equipe de militares e máquinas.

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